I - A condição colonial - literatura e situação
O problema das
origens da nossa Literatura não pode formular-se em termos de Europa, mas nos
mesmos termos de outras literaturas americanas, isto é, a partir da afirmação
de um complexo colonial de vida e de pensamento.
Assim, de um lado
houve a dispersão do país em subsistemas regionais, até hoje relevantes para a
história literária; de outro, a seqüência de influxos da Europa, responsável
pelo paralelo que se estabelec e entre os momentos de além-Atlântico e as
esparsas manifestações literárias e artísticas do Brasil- Colônia: Barroco,
Arcádia, Ilustração, Pré-Romantismo....
A busca de fontes
ideológicas não-portuguesas ou não-ibéricas, em geral, já era uma ruptura consciente com o passado e um caminho para
modos de assimilação mais dinâmicos, e propriamente brasileiros, da cultura
européia, como se deu no período romântico.
Textos de informação
Os primeiros
escritos da nossa vida documentam precisamente a instauração do processo: são informações
que viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e o homem
brasileiro. Enquanto informação, não pertencem à categoria do literário, mas à
pura crônica histórica e, por isso, há quem as omita por escrúpulo estético.
No entanto, a
pré-história das nossa letras interessa como reflexo da visão do mundo e da
linguagem que nos legaram os primeiros observadores do país. E não só como
testemunhos valem estes textos, mas também como sugestões temáticas e formais.
Alguns dos texto
merecem destaque, como é o caso da Carta de Pero Vaz de Caminha, O Diário de
Navegação de Pedro Lopes, o Tratado da Terra do Brasil, etc.
A Carta de Caminha
O que para nós
representou a Certidão de nascimento do nosso país, era gênero copiosamente
representado durante o século XV em Portugal e Espanha: a literatura de
viagens, e uma transparente ideologia mercantilista pelo zelo missionário de
uma cristandade ainda medieval.
Gândavo
Quanto a Pero de
Magalhães Gândavo, português, de origem flamenga, vem-se-lhe os primeiros
wiiormes sistemáticos do Brasil: o Tratado.
Trata-se
naturalmente de uma objetividade relativa ao universo do autor: humanista,
católico, interessado no proveito do Reino. O nativismo aqui como em outros
cronistas, situa-se no nível descritivo e não tem qualquer conotação subjetiva
ou polêmica.
Sua atitude em
face do índio prende-se aos comuns padrões culturais de português e católico
medieval; e vai da observação curiosa ao juízo moral negativo.
A História termina com uma das tônicas da
literatura informativa: a preocupação com o ouro e as pedras preciosas que se
esperava existissem em grande quantidade nas terras do Brasil.
O Tratado de Gabriel Soares
Quanto a Gabriel
Soares de Sousa, a crítica histórica tem apontado o seu Tratado Descritivo do
Brasil em 1587 como a fonte mais rica de informações sobre a colônia no século
XVI.
O Tratado consta
de duas partes: “Roteiro Geral com Largas Informações de Toda a Costa do Brasil,
de caráter geo-histórico e bastante minucioso; e o “Memorial e Declaração das
Grandezas da Bahia de Todos os Santos, de sua Fertilidade e das Outras
Partes que Tem”
A Informação dos Jesuítas
Paralelamente à
crônica leiga, aparece dos jesuítas, tão rica de informações e com um quê de
intenção pedagógica e moral.
De Nóbrega, temos
o “Diálogo sobre a Conversão do Gênio”, documento notável pelo equilíbrio com
que o sensato jesuíta apresentava os aspectos “negativos” e “positivos” do
índio, do ponto de vista da sua abertura à conversão.
Mas é o Anchieta,
poeta e dramaturgo que interessa ao estudioso da incipiente literatura
colonial. E se os seus autos são definitivamente pastorais, destinados à
edificação dos índios e do branco em certas cerimônias litúrgicas, o mesmo não
ocorrem com seus poemas que valem como estruturas literárias.
A linguagem
molda-se na tradição medieval espanhola e portuguesa. Pode-se dizer mesmo que o
vetor afetivo de Anchieta é a consolação pelo amor. Quanto aos autos atribuídos
a Anchieta, deve-se insistir na sua menor autonomia estética: são obra
pedagógica, que chega a empregar ora o português, ora o tupi, conforme o
interesse ou o grau de compreensão do público a doutrinar.
Os autos de
Anchieta, como os mistérios e as moralidades da Idade Média. materializam nas
figuras fixas dos anjos e dos demônios os pólos do Bem e do Mal, entre os quais
oscilaria o cristão; daí o seu realismo, que à primeira vista parece direto e
óbvio, ser, no fundo, alegoria.
Da crônica à história: Frei Vicente, Antonil
Nem sempre é fácil
distinguir a crônica da história quando se lida com textos coloniais. Um
balanço da prosa do primeiro século e meio de vida colonial dá-nos elementos
para dizer que o puro caráter informativo referencial predomina e pouco se
altera até o advento do estilo barroco.
II- Ecos do Barroco - Barroco: Espírito e estilo
Seja qual for a interpretação que se dê ao barroco, é sempre útil refletir
sobre a sua situação de estilo pós-renascentista e, nos países germânicos,
pós-reformista.
É na estufa da
nobreza e do clero espanhol, português e romano que se incuba a maneira
barrocojesuítica: trata-se de um mundo já em defensiva, organicamente preso
Contrarreforma e ao Império filipino, e em luta com as áreas liberais do
Protestantismo e do racionalismo crescente na Inglaterra, na Holanda e na
França.
É instrutivo
observar que o Barroco-jasuítico não tem nítidas fronteiras espaciais, mas
ideológicas. Floresce em vários países da Europa, mas já não se reconhece nas sóbrias
estruturas da arte coetânea da Suécia e da Alemanha cujo “barroco” luterano é
infenso a extremos gongóricos da imagem e do som.
Em suma,
desvalorizar um poema barroco porque “vazio” ou mitizá-lo porque rebuscadamente
estilizado é, ainda e sempre, cometer o pecado de isolar espírito e forma, e
não atingir o plano da síntese estética que deve nortear, em última instância,
o julgamento de uma obra.
Suposto no artista
barroco um distanciamento da práxis, entende-se que a natureza e o homem se
constelassem na sua fantasia como quadros fenômenos instáveis.
O que importa,
pois, é não nomear plebelamente o objeto, mas envolvê-lo em agudezas e torneios
de engenho, critérios básicos de valor na arte consciente.
O limite inferior
dessa arte é o cerebrino.
O rebuscamento em
abstrato é sem dúvida o lado estéril do Barroco e o seu estiolar-se em
barroquismo.
O primeiro passo
para o deslinde da morfologia barroca foi dado pelo historiador de arte
Heinrich Woelfflin, cujo texto “Renaissance und Barok” abriu uma nova
problemática que ainda hoje preocupa os estudiosos da forma. Mas só nos
“Conceitos Fundamentais de História da Arte” definiria a passagem a passagem
ideal do clássico ao Barroco em termos de uma passagem.
A possibilidade de formas de expressão esfumadas, ambíguas, não-finitas
Todos estes
caracteres quadram bem a um estilo voltado para a alusão e para a ilusão
enquanto fuga da realidade convencional. É de esperar que os recursos dessa visão do
mundo sejam, na poesia, as figuras: sonoras, sintáticas, e, sobretudo
semânticas. enfim todos os processos que reorganizam a linguagem comum em
função de uma nova realidade: a obra, o texto. a composição.
O Barroco no Brasil
No Brasil houve
ecos do Barroco Europeu durante os séculos XVII e XVIII.
Na segunda metade
XVIII, porém, o ciclo do ouro já daria um substrato material à arquitetura, à
escultura e à vida musical, de sorte que parece lícito falar de um “Barroco
Brasileiro” e, até mesmo, mineiro. Alguns trabalhos do Aleijadinho, de Manuel
da Costa Ataíde, e composições sacras de Lobo de Mesquita.
A poesia coetânea
delas já não é, senão residualmente, barroca, mas rococó, arcádica e
neoclássica, havendo portanto uma
discronia entre as formas expressivas.
Autores e obras - A “Prosopopéia” de Bento Teixeira
O poemeto em
oitavas heróicas “Prosopopéia” de Bento Teixeira, publicada em 1601, pode ser
considerado um primeiro e canhestro exemplo de maneirismo nas letras da
Colônia.
A imitação de “Os
Lusíadas” é assídua, desde a estrutura até o uso dos chavões da mitologia e dos
torneios sintáticos. O que há de não português no poemeto, como a “Descrição do
Recife de Pernambuco”, “Olinda Celebrada” e o canto dos feitos de Albuquerque
Coelho, entra a título de louvação à terra enquanto colônia.
Gregório de Matos
Poesia muito mais rica, que interessa não só como documento da vida social
dos Seiscentos, mas também pelo nível artístico que atingiu.
Contrastes da
produção literária: a sátira mais irreverente com a contrição do poeta devoto;
a obscenidade do “capadócio”. O desejo de gozo e da riqueza são mascarados
formalmente por uma retórica nobre e moralizante, mas afloram com toda
brutalidade nas relações com as classes servis que delas saem mais aviltadas.
Daí, o “populismo” chulo que irrompe às vezes e, longe de significar uma
atitude antiaristocrática, nada mais é que válvula de escape para velhas
obsessões sexuais ou arma para ferir os poderosos invejados.
Gregório moteja
aqueles senhores de engenho que, já mestiçados de português e tupi, presumiam
igualar-se em prosápia com a velha nobreza branca que formaria o “antigo
estado” da Bahia.
Alguns de seus
sonetos sacros e amorosos transpõem como brilho esquemas de Gángora e de
Quevedo e valem como exemplo do gosto seiscentista de compor símiles e contrastes
para enfunar e destrinçar conceitos.
Em toda a sua
poesia o achincalhe e a denúncia encorpam-se e movem-se à força de jogos
sonoros, de rimas burlescas de uma sintaxe apertada e ardida, de um léxico
incisivo, quando não retalhante; tudo o que dá a seu estilo uma verve não
igualada em toda a história da sátira brasileira posterior.
Botelho de Oliveira
Estamos diante de
um poeta literato stricto sensu, capaz de escrever com igual perícia em
quatro idiomas e nas várias formas fixas herdadas ao trovadorismo e aos
renascentistas: sonetos, madrigais, redondilhas, romances, epigramas, oitavas,
décimas...O virtuosismo em Botelho apela abertamente para os modelos da época.
Parece-me, porém,
útil insistir em duas matrizes que subjazem aos diversos processos estilísticos
de Botelho, pois valem para o gongorismo em geral. A primeira reside no princípio da analogia
em geral desfrutado em todas as suas possibilidades.
A analogia,
aproximando palavras em função de suas camadas sensíveis ou lógicas, também
conduz a colagens de substantivos e adjetivos cujo efeito é o puro insólito.
Outra constante da
linguagem marinista é o acentuar dos contrastes, reduzindo-os ao paradoxo, isto
é, à violenta junção dos opostos.
A Prosa Vieira
A prosa branca
está representada em primeiro plano pela oratória sagrada dos jesuítas. O nome
central é o de Padre Antônio Vieira.
Existe um Vieira
brasileiro, um português e um europeu, e essa riqueza de dimensões deve-se não
apenas ao caráter supranacional da Companhia de Jesus que ele tão bem encarnou,
como à sua estrutura humana em que não me parece exagero reconhecer traços de
gênio
No seu espírito verdadeiramente barroco fermentavam as
ilusões do estabelecimento de um Império luso e católico, respeitado por todo o
mundo e servido pelo zelo do rei, da nobreza, do clero. Como intérprete
fantasioso dos textos bíblicos em função do sebastianismo popular, vê
frustradas as suas profecias além de trair suspeitas para as suas obras
“heréticas”.
De Vieira ficou o testemunho de um arquiteto incansável de
sonhos e de um orador complexo e sutil, mais conceptista do que cultista,
amante de provar até o sofisma, eloqüente até à retórica, mas assim mesmo, ou
por isso mesmo, estupendo artista da palavra.
Ao leitor brasileiro interessam particularmente:
“O Sermão da Primeira Dominga da Quaresma”.
Não se diga que foi insensível ao
escravo negro preterindo-o no ardor de defesa indígena. No “Sermão XIV do
Rosário”, pregado em 1633 à Irmandade dos Pretos de um engenho baiano, ele
equipara os sofrimentos de Cristo ao dos escravos.
Prosa alegórica
Curioso exemplo de prosa narrativa
barroca deparamos no Compêndio Narrativo
de Peregrino da América. Trata-se de uma longa alegoria dialogada, muito
próxima do estilo dos moralistas espanhóis e portugueses que trocaram em miúdos
os princípios estéticos da Contrarreforma.
A paisagem que serve de fundo aos
diálogos é um misto de realismo e alegoria.
O romance didático foi também cultivado
por Teresa Margarida da Silva. A rigor, não pertenceria à nossa literatura
apesar de ter sido chamada a “precursora do romance brasileiro”. Em meados do
século XVIII, ultrapassa os limites do Barroco não só histórica mas
ideologicamente: o conteúdo das suas alegorias tem já um sabor iluminista; e
atrás de uma prosa ainda afetada de cultismos entrevê-se o amor à ordem, à
simplicidade e às virtudes racionais que a ciência e a nova pedagogia
afrancesada vinham pregando.
As academias
Das Academias brasileiras pode-se dizer
que foram o último centro irradiador do Barroco literário; o primeiro sinal de
uma cultura humanística viva, extraconvencional, em nossa sociedade.
Foram às baianas as academias mais
fecundas, com alguma relevância às do Rio de Janeiro.
Ao lado destas instituições podem-se
citar os “atos acadêmicos”, sessões literárias que duravam algumas horas e
tinham por fim celebrar datas religiosas ou engrandecer os feitos de
autoridades coloniais.
Cumpre ainda falarmos sobre a “Academia
Brasílica dos Esquecidos”, cujos planos era estudar a história natural,
militar, eclesiástica, e política do Brasil e discutir nas sessões os versos
compostos pelos acadêmicos.
Os Esquecidos foram cerebrinos fazedores
de acrósticos e mesósticos, sonetos joco-sérios e plurilíngues, centões
bestialógicos e até engenhos pré-concretos.
As academias e os atos acadêmicos
significam que a Colônia já dispunha, na primeira metade do século XVIII, de
razoável consistência grupal. E embora se tenham restringido a imitar os
sestros da Europa barroca, já puderam nutrir-se da história local.
Nas esferas ética e cultural está ainda
por fazer-se o inventário da herança colonial-barroca em toda a América Latina.
Entre os caracteres mais ostensivos lembrem-se: o meufanismo verbal, com toda a
sequela de discursos familiares e acadêmicos; a anarquia individualista, que
acaba convivendo muito bem com o mais cego despotismo; a religiosidade dos dias
de festa; a displicência em matéria de moral; o vício do genealógico e do
heráldico nos conservadores; o culto da aparência e do medalhão; o vezo dos
títulos; a educação bacharalesca das elites; os surtos de antiquarismo a que
não escapam nem mesmo alguns espíritos superiores.
Esses traços se desenvolveram com as
estruturas sociais que presidiram à formação de nossas elites e têm reaparecido
sempre que o processo de modernização se interrompe ou cede á força da inércia.
III - Arcádia e
Ilustração - Dois Momentos: O Poético E O Ideológico
A passagem do barroco ao “barrocheto” e
ao rococó foi um processo estilístico interno na história da arte do século
XVIII e consistiu em uma atenuação dos aspectos pesados e maciços dos
Seiscentos. Nessa viragem prefiguram-se as tendências estéticas do Arcadismo
como busca do natural e do simples e adoção de esquemas rítmicos mais
graciosos, entendendo-se por graça uma forma específica e menor de beleza.
O que já se postulava no período áureo
do barroco em nome do equilíbrio e do bom gosto entra, no século XVIII, a
integrar todo um estilo de pensamento voltado para o racional, o claro, o
regular, o verossímil.
Importa, porém distinguir dois momentos
ideais na literatura dos Setecentos: a) momento poético que nasce de um
encontro, embora ainda amaneirado, com a natureza e os afetos comuns do homem,
refletidos através da tradição clássica e de formas bem definidas, julgadas
dignas de imitação; b) o momento ideológico, que se impõe no meio do século e
traduz a crítica da burguesia culta aos abusos da nobreza e do clero.
Denominador das tendências arcádicas é a
busca do verossímil. Segundo essa linha de pensamento, os mitos gregos, valem
como belas aparências do real, do mesmo real que a filosofia cartesiana atinge
com as seus conceitos.
É sabido que ambientes e figuras
bucólicas povoaram os versos dos autores setecentistas. O bucolismo foi para
todos o ameno artifício que permitiu ao poeta fechado na corte abrir as janelas
para um cenário idílico onde pudesse cantar, liberto das constrições da
etiqueta, os seus sentimentos de amos e de abandono ao fluxo da existência.
Há um ponto nodal para compreender o
artifício da vida rústica na poesia arcádica: o mito do homem natural cuja
forma extrema é a figura do bom selvagem.
No Arcadismo brasileiro, os traços
pré-românticos são poucos, espaçados embora às vezes expressivos, como em uma
ou outra lira de Gonzaga, em um outro rondó de Silva Alvarenga. Em nenhum caso,
porém, rompem o quadro geral de um Neoclassicismo mitigado onde prevalecem
temas árcades e cadências rococós.
O gosto da clareza e da simplicidade
graças ao qual puderam superar a pesada maquinaria cultista; os mitos do homem
natural, do bom selvagem, do herói pacífico.
Os autores e as obras -
Cláudio Manuel da Costa
Mais de um fator concorreu para que este
fosse o nosso primeiro poeta neoclássico: a sobriedade do caráter, a sólida
cultura humanística, a formação literária portuguesa e italiana e o talento de
versejar compuseram em
Glauceste Satúrnio o perfil do árcade por excelência.
O gosto melhor tem por vigas o motivo
bucólico e as cadências do soneto camoniano.
Não é ainda necessariamente sinal de
pré-romantismo.
Cláudio tento, com menor êxito, a poesia
narrativa e compôs a Fábula do Ribeirão
do Carmo e o poemeto épico Vila Rica. Ambos são curiosos documentos
da oscilação que sofria o escritor entre o prestígio da Arcádia e as suas
montanhas mineiras.
Basílio da Gama
Possui a mesma ambivalência e o mesmo
esforço no trato com a palavra. No seu Uruguai,
prevalecem o verso branco e o balanço entre os decassílabos heróicos e sáficos
aligeiram a estrutura do poema que melhor se diria lírico-narrativo do que
épico.
É o aqui e agora que urge sobre a
sensibilidade de Basílio.
A natureza é colhida por imagens densas
e rápidas; não são já mero arcadismo, mas caminho para o paisagismo romântico.
Esse móvel pano de fundo, que às vezes
vale por si próprio deslocando-se para o primeiro plano da tessitura narrativa,
é a novidade de Basílio no trato da epopéia.
Santa Rita Durão
No Caramuru de Fr. José de Santa Rita
Durão o índio é matéria prima para exemplificar certos padrões ideológicos. Mas
será uma corrente oposta à de Basílio, voltada para o passado jesuítico
colonial.
Se, pela cópia de alusões à flora
brasileira e aos costumes indígenas, o Caramuru
parece dotado de índole mais nativista do que o Uraguai, no cerne das intenções
e na estrutura, a epopéia de Durão está mais distante do homem americano do que
o poemeto de Basílio.
A poética que presidiu à feitura do
poema era híbrida. De um lado, esquemas camonianos, “corrigidos” pela presença
exclusiva do maravilhoso cristão. De outro, a tradição colonial-barroca que se
reflete no gosto das enumerações profusas da flora tropical.
No conjunto, porém, a sua extrema
fidelidade aos módulos clássicos e às hierarquias mentais da Contrarreforma
insere-o de pleno direito na linguagem conservadora que em Portugal resistiu à
maré iluminista.
Árcades Ilustrados:
Gonzaga, Silva Alvarenga, Alvarenga Peixoto
Há um ar de família que nos faz
reconhecer em Basílio e nesses poetas a mesma disposição constante para atenuar
em idílio tudo o que é tenso conflitante: o sentimento, mediado pela maneira
bucólica e rococó, é comum a todos. É comum o convívio com o Iluminismo que
levou os últimos à participação em grupos hostis ao regime. Gonzaga e Alvarenga
Peixoto estiveram na Inconfidência.
Gonzaga é conaturalmente árcade. Para os
românticos, que levariam o processo ao limite, a
natureza era o lugar sagrado da paixão, o cenário divino dos seus próprios
sonhos de liberdade e de glória. Mas para o
árcade ela ainda é pano de fundo.
Nas liras compostas no cárcere, o desejo
de temperar as próprias dores com novas galanterias e torneios mitológicos é
prova de um caráter incapaz de extremos.
Escreveu Cartas Chilenas no intuito de satirizar seu desafeto político.
Nas obras de Alvarenga Peixoto acham-se
traços esparços, mas fortes, de nativismo. Em geral, combina a loa do
progressismo com a aceitação do governo forte: é o déspota ilustrado o seu
ideal, tirano a quem se rende a Colônia na pessoa do nativo.
Quanto ao juízo estético sobre a lírica
de Alvarenga Peixoto, está pendente de poucas composições, sendo algumas de
autoria discutível.
Silva Alvarenga dá-nos a imagem cabal do
militante ilustrado. Mas a atenção do leitor amante da poesia logo se voltará
para a coerência formal de sua obra, Glaura, composta de rondós e madrigais.
Último dos neoclássicos de relevo, já
foi considerado, no entanto “o elo que prende os clássicos aos românticos”. É
verdade também que jogar com as linhas e as cores da paisagem para exprimir os
próprios afetos é ser pré-romântico em sentido lato.
Da Ilustração ao Pré-Romantismo
Nos primeiros decênios do século XIX as
fórmulas arcádicas servem de meio, cada vez menos adequado, para transmitir os
desejos de autonomia que a inteligência brasileira já manifestava em diversos
pontos da Colônia.
Uma hipótese para explicar o fenômeno é
ver o hibridismo cultural ideológico desse período a carência de mordente capaz
de organizar um estilo forte e duradouro.
O ecletismo teve nos gêneros públicos e
na poesia retórica a sua melhor expressão.
Por poesia
retórica entende-se aqui o verso que se propõe abertamente ensinar, persuadir,
moralizar; em suma, incutir um complexo de idéias e sentimentos. O
Iluminismo favorecia o gosto pedagógico, ministrando o útil, enquanto cabia ao
idílio árcade providenciar o agradável. Com o nosso hibridismo
ilustrado-religioso do começo do século XIX, é o
poema sacro, moralizante ou patriótico que vai substituir as tiradas em prol
das luzes do século anterior.
Os Gêneros Públicos
Ao lado dessa poesia, oscilante entre
velhos e novos padrões, florescem os gêneros nascidos da aberta inserção na
vida pública; o sermão, o artigo, o discurso, o ensaio de jornal.
Articularam-se as nossa letras
ante-românticas e se definiram as linhas ideológicas mestras do Primeiro
Império e da Regência.
Variam as tônicas no panfleto ou no sermão
conforme as raízes leigas ou religiosas.
Variavam também os objetos a que se
aplicava a idéia. Representam o liberalismo de centro dois admiráveis
publicistas da época, Hipólito da Costa Pereira e Evaristo da Veiga. Cada um à
sua maneira criou molde brasileiro da prosa jornalística de ideias. Para ambos,
a liberdade é, acima de tudo, possibilidade de expressão, de informação, de
crítica. São os clássicos do respeito aos direitos civis, à Constituição.
Diferem em grau. Difere
também pelas próprias circunstâncias de tempo em que atuaram. A prosa de Hipólito
é a do ensaísmo ilustrado. A de Evaristo cinge-se à crônica política que
tempera como pode as reações ao imprevisto.
Influência e, mais que influência,
fascínio, exerceu a palavra de um orador sagrado, Frei
Francisco de Monte Alverne, que carreou para o limiar do Romantismo uma nova
sensibilidade. Foi ele quem primeiro sentiu a inflexão espiritualista da Europa
romântica.
IV-O Romantismo -
Caracteres Gerais
O amor e a pátria, a natureza e a
religião, o povo e o passado, que afloram tantas vezes na poesia romântica, são
conteúdos brutos, espalhados por toda a história das literaturas, e pouco
ensinam ao intérprete do texto, a não ser quando opostos em situação,
tematizados e lidos como estruturas estéticas.
A situação dos vários
romantismos
O Romantismo expressa os sentimentos dos
descontentes com as novas estruturas: a nobreza, que já caiu, e a pequena
burguesia que ainda não subiu: de onde, as atitudes saudosistas ou
reivindicatórias que pontuam todo o movimento.
Assim, apesar das diferenças de situação
material, pode-se dizer que se formaram em nossos homens de letras
configurações mentais paralelas às respostas que a inteligência européia dava a
seus conflitos ideológicos.
Os exemplos mais persuasivos vêm dos
melhores escritores. O romance colonial de Alencar e a poesia indianista de
Gonçalves Dias nascem da aspiração de fundar um passado mítico a nobreza
recente do país.
Como os seus ídolos europeus, os nossos
românticos exibem fundos traços de defesa e evasão, que os leva a posições
regressivas: no plano da relação com o mundo e no das relações com o próprio
eu.
O fulcro da visão
romântica do mundo é o sujeito, que é o emissor da
mensagem.
A natureza romântica
é expressiva. Ao contrário da natureza árcade, decorativa. Prefere-se a noite ao dia, pois à luz crua do sol
impõe-se ao indivíduo, mas é na treva que latejam as forças inconscientes da
alma: o sonho, a imaginação.
A nação afigura-se ao patriota do século
XIX como uma idéia-força que tudo vivifica. Acendra-se o culto à língua nativa
e ao folclore.
O homem romântico reinventa o herói, que assume dimensões
titânicas, sendo afinal reduzido a cantor da própria solidão.
A renovação nas camadas sonora atingiu o
cerne do verso, o ritmo, distendendo-o em função da melodia que, veículo mais
adequado às efusões do sentimento, contou com a preferência dos poetas e,
naturalmente, dos compositores:
Renascem, por outro lado, formas
medievais de estrofação e dá-se o máximo relevo aos metros breves, de cadência
popular, os redondilhos maiores e menores, que passam a competir com o nobre
decassílabo.
Gênero entre todos contemplado foi o
romance, os românticos acresceram-lhes a ficção histórica e o romance
egótico-passional, formas acessíveis ao novo público leitor composto
principalmente de jovens e de mulheres, ansioso de encontra na literatura a
projeção dos próprios conflitos emocionais. O romance foi, a partir do
Romantismo, um excelente índice dos interesses da sociedade culta e semiculta
do Ocidente. A sua relevância no século XIX se compararia, hoje, à de cinema e
da televisão.
O Romantismo oficial no
Brasil - Gonçalves de Magalhães
Coube alguns escritores da segunda plana
a introdução do Romantismo como programa literário no Brasil.
O nome de Gonçalves de Magalhães é
tradicionalmente lembrado pela baliza da publicação dos Suspiros Poéticos e Saudades, livro e data que a história fixou
para a introdução do movimento entre nós.
A relevância histórica reside no fato de
Magalhães não ter operado sozinho como imitador de Lamarti e Manzoni, mas de
ter produzido junto a um grupo, visando a uma reforma da literatura brasileira.
João Caetano compôs a primeira tragédia
escrita por um brasileiro e único de assunto nacional.
Tendo nos dado o lírico e o dramático,
faltava-lhe o épico: fê-lo retomando Durão e Basílio, lidos se um ângulo
enfaticamente nativista, e compôs a Confederação
dos Tamoios.
Porto Alegre
O principal companheiro de Magalhães no
grupo de Niterói de nada o ultrapassou: Manuel de Araújo Porto Alegre. Reuniu
seus poemas nas Brasilianas, escritas
com o intuito confesso de acompanhar o Sr. Magalhães na reforma da arte por ele
feita em 1836.
A Historiografia
O índio, fonte de nobreza nacional,
seria, em princípio, o análogo do bárbaro. O Romantismo refez sua semelhança à
imagem da Idade Média, conferindo-lhe caracteres “romanescos” de que se nutriu
largamente a fantasia de poetas, narradores e eruditos durante quase meio
século.
Esse complexo ideo-afetivo não abarca
todo o Romantismo, mas uma área bem determinada como classe e como tendência
intelectual.
O nosso indianismo de Varnhagen a
Alencar, pendeu para o extremo conservador, como todo o contexto social e
político do Brasil dos fins da Regência à década de 60.
Teixeira e Sousa
A este deve-se o primeiro romance
brasileiro: O Filho do Pescador. É como narrador folhetinesco que nos
interessa. O romance de capa-e-espada, as novelas ultra-românticas e os
dramalhões, chancelados por hábeis manejadores de pena como Eugène Sue, Scribe,
etc., foram os modelos, diretos ou não, de Teixeira e Sousa. Oculto da
peripécia em todos os seus romances produz sempre a justaposição, único modo de
levar adiante o romance: acidentes, reconhecimentos, avanços e retornos, até
que o processo sature o autor e o leitor e dê por findo o passatempo. Seja como
for, foi com ele que o Romantismo caminhou para a Narração.
A poesia - Gonçalves
Dias
Foi o primeiro poeta autêntico a
emergirem nosso Romantismo. A sua personalidade
de artista soube transformar os temas comuns em obras poéticas duradouras.
Mas é preciso ver na força de Gonçalves
Dias indianista o ponto exato em que o mito do bom selvagem, constante desde os
árcades, acabou por fazer-se verdade artística.
Para a primeira geração romântica,
porém, presa a esquemas conservadores, a imagem do índio casava-se sem traumas
com a glória do colono que se fizera brasileiro, senhor cristão de suas terras
e desejoso de antigos brasões. E a perspectiva sua até a última sua produção
indianista.
Um dos caracteres da poesia americana de
Gonçalves Dias, e que as distancia da frouxidão das experiências anteriores, é
a entrada súbita de vigor de selvagem desejado.
O exemplo de Gonçalves Dias artífice do
verso sobrevive aos românticos e toca os parnasianos.
A sua lírica singulariza-se no conjunto
da poesia romântica brasileira como a mais literária, isto é, a que melhor
exprimiu o caráter mediador entre os pólos da expressão e da construção. Ele é
o clássico do Romantismo.
O romantismo Egótico: A
2ª Geração
Na segunda geração romântica, a poesia
brasileira percorrerá os meandros do extremo subjetivismo. Alguns poetas
adolescentes, mortos antes de tocarem a plena juventude, darão exemplo de toda
uma temática emotiva de amor e morte, dúvida e ironia, entusiasmo e tédio.
Romantismo quer dizer, antes de mais
nada, um progressivo dissolver-se de hierarquias em estados de alma
individuais.
A poesia de Álvares de Azevedo e a de
Junqueira Freire oferecem rica documentação para a psicanálise.
Álvares de Azevedo
Foi o escritor mais bem dotado de usa
geração. Em vários níveis se apreendem as suas tendências para a evasão e para
o sonho. A camada dos sonhos compõe ritmos frouxos, melodias lânguidas e fáceis
que se prestam antes à sugestão de atmosferas que o recorte nítido de
ambientes.
As comparações e as metáforas traduzem
no concreto das imagens naturais os mesmos sentimentos básicos: a flor
desfolhada lembra a juventude sem viço; o sussurro da brisa semelha o suspiro
do amante; e “as ondas são anjos que dormem no mar”.
Nessa literatura a fusão de libido e
instinto de morte, caminhava na esteira de um Romantismo em progresso enquanto
trazia à luz da contemplação poética os domínios obscuros do inconsciente.
Junqueira Freire
É precisamente esse convívio tenso entre
eros e thanatos que sela a
personalidade do religioso e do artista malogrado.
Cria um estilo viril que nada deve aos
clássicos em rigor e precisão: essa era a “art romantique” rica de sons e de
imagens, de movimento e de tensão, que Baudelaire
cultuava como fonte de seu próprio estilo. Dela nada existia em Junqueira Freire.
Laurindo Rabelo
As fontes populares estavam presentes no
“poeta lagartixa” e poeta de salão. Por isso mesmo representativo do gosto
romântico médio do Brasil Império.
A trova, os redondilhos, as rimas emparelhadas
são os seus meios de expressão congenitais, e, na mesma linha de simplicidade,
são as flores que lhe oferecem material copioso para enumerações e metáforas.
Contorce aqui e lá a dicção, à procura
de uma graça decorativa que possa produzir efeito entre os seus ouvintes cultos
ou pseudocultos.
Sua obra pode ser uma das balizas para
um estudo que a nossa cultura reclama: o das relações entre a linguagem do
povo, da classe média e dos grupos de prestígio nos meios urbanos.
Casimiro de Abreu
Operou uma descida de tom em relação à
poesia dos anteriores. O que singulariza o poeta é o modo de compor, que
remonta, em última análise, ao seu modo de conhecer a realidade na linguagem e
pela linguagem.
Reduzia a natureza e o próximo a um
ângulo menor: o do seu temperamento sensual e menineiro que o aproxima bastante
dos literatos fluminenses coevos.
Epígonos
Nos anos de cinqüenta, um grupo
realmente novo pelo espírito e pela forma, encontram-se os epígonos, que
retomam o americanismo ou as efusões sentimentais.
Varela
O epígono por excelência, foi, sem
dúvida, Fagundes Varela. O único nome de relevo na poesia da década de 60.
Mais que os seus modelos, sensível à
lira patriótica de filiação liberal: índice de uma tendência que inverteu, a
partir de 60, aquele signo áulico manifesto no coro dos contentes.
Prenuncia os condoreiros pelo ardor
nacionalista, no tratamento precoce do tema do negro em relação à literatura
abolicionista dos decênios seguintes.
Quando o poeta publica seu melhor livro
- Cantos e Fantasias - começa a fazer-se conhecido um dos maiores poetas do
nosso Romantismo, Antônio de Castro Alves.
A sua estréia coincide com o amadurecer
de uma situação nova: a crise do Brasil puramente rural e o firme crescimento
da cultura urbana. Outros são agora os modelos poéticos.
Castro Alves será novo pelo epos
libertário, bem como nos seus versos de substância amorosa pela franqueza no
exprimir seus desejos e os encantos da mulher amada. Com ele fluem sem meandros
as correntes de uma renovada lírica erótica.
A indignação, móvel profundo de toda
arte revolucionária, tende, na poesia de Castro Alves, a concretar-se em
imagens grandiosas que tomam à natureza, à divindade, à história personalizada
o material para metáforas e comparações.
E nenhum mito mais eloqüente para a
expressão do herói romântico do que o mito de Titã.
Os seus símiles são quase sempre tomados
aos aspectos da natureza que sugerem a impressão de imensidade, de infinitude.
Porém, nele, nem tudo é hiperbólico.
“Condores”
Vários poetas coetâneos de Castro Alves,
ou vindos pouco depois, servem de documento para a história dos sentimentos
liberais e abolicionistas que, a partir de 70, dominaram a nossa vida pública.
Sousândrade
Um espírito originalíssimo para seu
tempo. Romântico da segunda geração notava-se nele um maior cuidado na escolha
do léxico e no meneio sintático.
Mas o pedantismo ainda acerbo das Harpas não significava, nesse talento
dinâmico, apenas um resquício purista: era prenúncio do escritor atento às
técnicas de dicção, e que seria capaz de manejar com a mesma ductibilidade as
fontes e os compostos do jargão yankee.
Outra novidade de Sousândrade em relação
a toda a poesia brasileira do século XIX reside nos processos de composição: de
insólitos arranjos sonoros ao plurilinguismo; dos mais ousados conjuntos
verbais à montagem sintática.
A Ficção
Não se registrou nenhuma evolução no
fato de Alencar ter escrito primeiro Lucíola
e depois O Gaúcho. O deslocar-se do eixo geográfico deu-se pela própria
dispersão, no tempo e no espaço, em que viviam os escritores.
As tentações de ordenar os romances a
partir de dados externos explicam-se pela natureza do gênero. Por isso, todo o
critério abstrato de progresso pode ser fatal ao julgamento de um romancista.
Pode ser estranho, se não perigoso
resíduo idealista, separar os métodos que abordam os consumidores da obra dos
que visam entender os seus produtores.
A escala de valores já ficou sugerida
atrás; a obra será tanto mais válida, esteticamente, quanto melhor souber o
autor usar a margem de liberdade que lhe permitirem as pressões psicológicas e
sociais.
Macedo
A cronologia manda começar pelo Romance
de Joaquim Manuel de Macedo. Autor de A Moreninha, diluí-las em mais dezessete
romances. Em todos eles o gosto do puro romanesco é importado, mas são nossos
os ambientes, as cenas, os costumes, os tipos, em suma, o documento.
Percebe-se nele uma carência de realidade
moral não compensada pela cópia de traços pitorescos e pelas digressões
sentimentais.
Sub-romancista pela pobreza da fantasia,
sub-romântico pela míngua do sentimento. Faltava a Macedo o senso vivo do
ridículo em que as convenções enredam o homem comum.
Manuel Antônio de
Almeida
Memórias
de um Sargento de Milícias estão isentas de qualquer traço idealizante
e procuram despregar-se da matéria romanceada graças ao método objetivo de
composição, próximo do que seria uma crônica histórica cujo autor se divertisse
em resenhar as andanças e os pecadilhos do uomo qualunque.
Em Manuel, o compromisso é mais alto e
legítimo, porque se faz entre o relato de um momento histórico e uma visão
desenganada da existência, fonte de humor difuso no seu único romance.
O seu valor reside principalmente em ter
captado, pelo fluxo narrativo, uma das marcas da vida na pobreza, que é
perpétua sujeição à necessidade, sentida de modo fatalista como o destino de
cada um.
Esta obra nos dá uma idéia da vida
familiar brasileira nos meios urbanos em uma fase em que já se esboçava uma
estrutura não tão mais puramente colonial, mas ainda longe do quadro industrial
burguês.
Alencar
Merece o lugar de centre pela natureza e
expressão de sua obra. Em Sonhos d’Ouro, traçou um quadro retrospectivo da sua
ficção, onde se mostrara consciente de ter abraçado todas as etapas da vida
brasileira.
Essas linhas indicam que pretendia
cobris com sua obra narrativa passado e presente, cidade e campo, litoral e
sertão, e compor uma espécie de suma romanesca do Brasil. No entanto, seus
vinte e um romances possuem traços visceralmente românticos.
O Romantismo de Alencar é, no fundo,
ressentido e regressivo, o que lhe dá sentido na história da nossa cultura e
ajuda a explicar muitas das suas opções estéticas.
Para dar forma ao herói, não via meio
melhor do que amalgamá-lo à vida da natureza. O tropismo para a vida natural é
a outra face da aversão que o romancista votava ao progresso.
O Brasil ideal, para ele, seria urna
espécie de cenário selvagem, onde expulsos os portugueses, reinariam capitães
altivos, senhores de baraço e cutelo rodeados de sertanejos e peões, livres
sim, mas fiéis até a morte.
O escritor que idealizara heróis míticos
no coração da floresta é o mesmo que sabe recortar as figuras gentis de
donzelas e mancebos nos salões da Corte e nos passeios da Tijuca.
Ao descrever a natureza e os ambientes
internos, é tão preciso como qualquer prosador do fim do século.
Sertanistas. Bernardo
Guimarães, Taunay, Távora
São regionalistas. As várias formas de
sertanisrno que têm sulcado as nossas letras desde meados do século passado,
nasceram do contato com de urna cultura citadina e letrada com a matéria bruta
do Brasil rural, provinciano e arcaico.
Era o amor que estava presente nas
intenções dos sertanistas românticos.
O regionalismo de Bernardo Guimarães
mistura elementos tomados à narrativa oral, os “causos” e as “estórias” de
Minas e Goiás, com uma boa dose de idealização.
As obras mais lidas de Bernardo, O
seminarista e A Escrava Isaura, devem a sua popularidade menos a um progresso
na fabulação ou no traçado das personagens do que à garra dos problemas
explícitos: o celibato no primeiro e a escravidão no segundo.
O
Seminarista está na linha do romance passional. Já
A Escrava Isaura, foi chamado A Cabana do pai Tomás nacional.
Visconde de Taunay tinha condições de
dar ao regionalismo romântico a sua versão mais sóbria. Foi capaz de enquadrar
a história de Inocência em um cenário e em um conjunto de costumes sertanejos
onde tudo é verossímil. Sabia explorar na medida justa o cômico dos tipos. No
âmbito de nosso regionalismo, romântico ou realista, nada há que supere
Inocência em simplicidade e bom gosto.
Com a obra O gaúcho, Franklin Távora
quis introduzir, já no apagar das luzes da ficção romântica, um critério mais
rigoroso de verossimilhança.
Não cumpriu com Cabeleira sua promessa
de uma literatura nordestina. Literariamente, é uma sofrível mistura de crônica
do cangaço e expedientes melodramáticos.
Os manifestos e os prólogos de Távora
podem ser lidos como sinal avançado dos riscos que o provincianismo traz para a
literatura; ou, num plano histórico, como sintoma dos fundos desequilibrados
que já no século XIX sofria o Brasil como nação desintegrada, incapaz de
resolver os contrastes regionais e à deriva de uma política de preferências
econômicas fatalmente injusta.
O Teatro - Em
termos de valor, deve-se distinguir um teatro Romântico menor, preocupado com a
nacionalização da nova literatura.
Martins Pena
Assinou os primeiros textos teatrais,
numa linguagem coloquial que, no gênero, não foi superada por nenhum outro
comediógrafo do século passado. O tom passa do cômico ao bufo, e a
representação pode virar farsa a
qualquer tempo.
Seu modo de sentir o social já era bem
menos conservador que do primeiro grupo romântico. O eixo de sua comédia é o crescendo da urbanização, que desintegra o velho artesanato da Corte.
São diálogos
que valem como excelente testemunho da língua coloquial brasileira tal como se
apresentava em meados do século XIX.
Gonçalves Dias
Sua melhor obra
teatral, Leonor de Mendonça, tinha linha européia do drama
histórico. Compôs o drama com os olhos
postos na restauração do teatro português.
A consciência do novo, do não mais clássico, também se revela pela
justificação da prosa em lugar do verso, bem como pela apologia de um modelo
shakesperiano de tragédia onde prosa e verso se revezariam segundo o tom e o
ritmo dos afetos que movem os personagens.
Alencar
Dose de
“brasilidade”, compôs Verso e Reverso. O Demônio Familiar, comédia em
que os vaivérs da intriga são obra de um escravo.
A Consciência histórica e crítica
A crítica deste
período tem como fator comum a ênfase dada à autonomia do país. Há em todo o
país um nacionalismo crônico e quase agudo que se baseiam no indianismo, no
regionalismo, sertanismo.
Porém, não foi
sempre esta a linha seguida pelos jovens da época, Dividem-se então estes em
grupos distintos entre si:
a)
Grupo
fluminense - entre passadista e eclético, instala oficialmente o Romantismo no
teatro, historiografia e poesia;
b)
Grupo
paulista - fundam uma sociedade que defendem as teses americanistas;
c)
Grupo
maranhense - paralelo aos anteriores, porém, mais liberais;
d)
Grupos
pernambucano- representa a ponte de lança do progressismo liberal romântico.
Tradicionalismo
As antinomias que
marcaram o século XIX foram várias: campo/cidade, poder central/poder local;
etc. A conciliação ideológica se fez a partir da primeira geração romântica.
Surgem correntes abolicionistas e republicanas. O Brasil tem uma literatura
original a partir da Independência.
Dá-se ênfase ao
nexo entre as letras e os contextos histórico-geográficos.
Radicalismo
Das províncias do
Nordeste vieram formas de pensar mais críticas. Surgem obras de cunho
“jacobinista” e que já fermentam idéias democráticas e socializantes.
V - O
Realismo um novo ideário
Com o Brasil em
crise, acelera-se a decadência da produção açucareira. Surge o fermento das
idéias liberais e abolicionistas. Entre os anos de 1870 e 1890 são estas as
teses esposadas pela inteligência nacional.
O tema da
Abolição, bem como o da República, serão o fulcro das opções ideológicas do
homem culto brasileiro a partir de 1870.
Deve-se à Escola
do Recife a transposição desta realidade em termos de consciência
cultural.
A atitude de
aceitação da existência tal qual ela se dá aos sentidos, desdobra-se na cultura
da época, em planos diversos mas complementares:
a)
no
nível ideológico, ou seja, na esfera de explicação do real;
b)
no
nível estético em que o próprio ato de escrever é o reconhecimento implícito de
uma faixa de liberdade.
O Realismo se
tingirá de Naturalismo, no romance e no conto, sempre que fizer personagens e
enredos se submeterem às lei naturais, ou se dirá Parnasiano, na poesia, do
verso sempre perfeito.
A ficção
O Realismo
ficcional aprofunda a narração de costumes contemporâneos da primeira metade do
século XIX e de todo o século XVIII. Aguçam-se os dons de observação. A
configuração do típico foi uma conquista do Realismo.
Em termos de
construção, houve descarnamento do processo expressivo. O determinismo reflete-se na
perspectiva em que se movem os narradores ao trabalhar as suas personagens.
Assim, do Romantismo ao Realismo, houve uma passagem do vago ao típico, do
idealizante ao factual.
Machado de Assis
Este é, sem dúvida, o ponto mais alto e
equilibrado da nossa ficção.
O seu equilíbrio era o dos homens que,
sensíveis à mesquinhez humana e à sorte precária do indivíduo, aceitam por fim uma
e outra como herança inalienável, e fazem de sua reflexão cotidiana.
Foi com um espírito de permanente alerta
para que nada de piegas, nada de enfático, nada de enfático nada de idealizante
se pusesse entre criador e criatura que machado escreveu suas obras.
Menos do que pessimismo sistemático,
melhor seria ver como suma da filosofia machadiana um sentido agudo ao
relativo: nada valendo como absoluto, nada merece o empenho do ódio ou do amor.
A sua ficção constitui, pelo equilíbrio
formal que atingiu um dos caminhos permanentes da prosa brasileira na direção
da profundidade e da universalidade.
Raul Pompéia
Autor de um livro só: O Ateneu, possuía dom de memorialista
finura de observação moral. Em sua obra, a captação dos ambientes e das pessoas
não dispensa o expressionismo da imagem. As aproximações são, em geral,
violentas e, no caso das pessoas, depressivas.
Não fora o seu talento excepcional de
artista, Raul Pompéia teria naufragado no puro romance de tese.
Aluísio Azevedo e os
principais naturalistas
Em Aluísio, a influência de Zola e de
Eça é facilmente sentida.
Em face de certa vaguidade romântica no
trato das personagens, foi salutar o deslocamento do eixo tara o homem comum,
desfigurado, mais do que se acreditava, pelos revezes da herança biológica, da familiar, da profissão.
O
Mulato, que passa pelo primeiro romance naturalista
brasileiro, dá uma boa visão do meio maranhense o tempo.
O mérito do autor estaria em saber
aplicar a outros ambientes o dom de observação de que fizera prova. Somente em O Cortiço atinou
de fato a forma que se ajustava a seu talento: Existe o quadro: dele derivam as
figuras.
O
Cortiço foi um passo adiante na história da nossa prosa.
Inglês de Sousa não foi menos
escrupuloso narrador de casos amazônicos com que antecipou o próprio Aluísio no
manejo da prosa analítica.
Do Naturalismo tomou Adolfo Caminha a
crença na fatalidade do meio e o gosto dos temas escabrosos. A Normalista e O
Bom Crioulo centram-se em casos de corrupção que a marcha da narrativa mostra
como inevitável.
Naturalismo estilizado:
“Art Nouveau”
Na década de 80 afirmara-se, com as
obras como O Cortiço, O Missionário e O Bom Crioulo, o Naturalismo entre nós.
Desenvolve-se um estilo mundano, meio
jornalístico, meio sofisticado.
Dos fins do século à guerra de 1914-18, a corrente mestra de
nossa literatura admirou supremamente desse estilo floreal.
Dessa indefinição adveio uma prosa
ficcional compósita, misto de documento e ornamento, aquém-to naturalismo na
medida em que se perdia em veleidades fantasistas, mas igualmente incapaz de se
fixar o Simbolismo pela carência de uma imaginação realmente criadora.
Coelho Neto
A fortuna crítica de Coelho Neto
conheceu os extremos do desprezo a da louvação. Sobressai como a grande
presença literária entre o crepúsculo do Naturalismo e a Semana de 22.
As qualidades mestras de Coelho Neto
ajustavam-se - curiosidade, memória e sensualidade verbal.
De relevância, escreve, em 1897, Inverno
em Flor, cuja obra possui viva coloração naturalista.
Em suma, sua linguagem é correta e
precisa até ao pedantismo, à obscuridade, ao preciosismo. O que validamente se
lhe contesta é aquela qualidade rara de atingir sem escórias um nível de
profundidade.
Afrânio Peixoto
Não
deixou uma obra de ficção tão volumosa, dadas as suas múltiplas curiosidades de
divulgador e erudito. Escreveu romances de costumes rurais. Seu realismo
sertanejo e, portanto, de extração romântica. No entanto, aquele seu mundanismo
diplomático que lhe desvirilizara os primeiros romances o impediu aqui de
ascender à epicidade bronca que o argumento propiciava.
O regionalismo como
Programa
Em alguns constistas, matéria rural é
tomada a sério, isto é, assumida nos seus precisos contornos físicos e sociais
dentro de uma concepção mimética de prosa..
O projeto explícito dos regionalistas
era a fidelidade ao meio de descrever: aprofundavam a linha realista
estendendo-a para a compreensão de ambientes rurais ainda virgens para a nossa
ficção.
Dentre os vários escritores que seguiram
esta linha, podemos citar: Afonso Arinos, Valdomiro Silveira, Simões Lopes
Neto, Alcides Maya, Hugo de Carvalho Ramos e, dentre todos estes, o mais
importante: Monteiro Lobato.
A Poesia
Com os promotores da Escola de Recife e
alguns poetas forrados de ingênuo materialismo e fortes convicções
antimonárquicas, pretendiam demolir, à força de versos libertários, os pilares
do conservantismo romântico que se ajustara tão bem ao sistema de valor do
Segundo Império.
Quanto ao nexo literatura-sociedade:
atuando entre 1880 e 90 os principais liberais e republicanos e fixando-se como
forma de vida do escritor a díade burocracia-boemia, vai perdendo terreno a
poesia de combate triunfando a escola oficial do verso parnasiano.
O Parnas1anismo
É na convergência de ideais
anti-românticos, como a objetividade no trato dos temas e o culto da forma, que
se situa a poética do Parnasianismo.
Seus traços de relevo são: o gosto da
descrição nítida, concepções tradicionalistas sobre metro, ritmo e rima e, no
fundo, o ideal da impessoalidade que partilhavam com os realistas do tempo.
Deste modo, cumpre lembrar alguns poetas
parnasianos tais como, Alberto de Oliveira, Raimundo Correia, Olavo Bilac,
Francisca Júlia, Artur Azevedo e Vicente de Carvalho.
Neoparnasianos
À geração dos poetas que estrearam entre
1880 e 90, sucedeu-se outra a que denominamos neoparnasiana, mas que no fundo,
é ainda parnasiana, epigônica.
Vista em conjunto, a poesia
neoparnasiana traduz em suma a persistência de uma concepção estética obsoleta,
que o Simbolismo europeu já ultrapassara, abrindo caminho para as grandes
correntes poéticas do novo século: futurismo, surrealismo, expressionismo...
Desta forma, o neoparnasiano que mais se
destacou foi: Raul de Leôni.
A consciência histórica
e crítica
Dentre os críticos que mais se
destacaram na linha de pensamento dos Realistas é lícito mencionarmos os nomes
de Capistrano de Abreu, Sílvio Romero, Araripe Júnior e José Veríssimo.
As letras como instrumento de ação
O período realista conheceu amplamente o
uso da palavra como forma de ação política.
A linha mestra de toda essa fase foi a
luta pela liberdade.
Nesses contextos há um nome que
testemunhou quase miticamente o modo de pensar das elites brasileiras que
constituíram a República: o de Rui Barbosa. Era um orador de notável cultura.
Jurista e político, participou da elaboração do projeto do Código Civil.
VI-O simbolismo
caracteres gerais
O símbolo reage às correntes analíticas
dos meados do século. Exprimem o desgosto das soluções racionalistas e
mecânicas e nestas reconhecem o correlato da burguesia industrial; ambos
recusam-se a limitar a arte ao objeto, à técnica de produzi-lo, enfim, esperam
ir além do empírico e tocar, com a sonda da poesia, um fundo comum que susteria
os fenômenos, chame-se Natureza, Absoluto, Deus ou Nada.
O símbolo assume nessas correntes a
função-chave de vincular a parte ao Todo universal que, por sua vez, confere a
cada uma seu verdadeiro sentido.
O Simbolismo surge nesse contexto como
sucedâneo, para uso de intelectuais, das religiões positivas.
O irracionalismo dos decadentes valeu
como sintoma de algo mais importante que os seus mitemas: o incômodo hiato
entre os sistemas pretensamente racionais e liberais da sociedade contemporânea
e a efetiva liberdade do homem que as estruturas socioeconômicas vão lesando na
própria essência, reduzindo-o a instrumento de mercado e congelando-o em papéis
cada vez mais oprimentes. Os Simbolistas tiveram esta função relevante: dizer
do mal-estar profundo que tem enervado a civilização industrial; e o fato de
terem oferecido remédios inúteis, quando não perigosos, porque secretados pela
própria doença, não se deve servir de pretexto para tardias excomunhões.
O Simbolismo no Brasil
Contemporâneos ou vindos pouco depois
dos poetas parnasianos e dos narradores realistas, Cruz e Sousa, Alphonsus de
Guimaraens e os simbolistas da segunda geração não tiveram atrás de si uma
história social diversa da que viveram aqueles.
Apesar disso, em virtude de terem
corrido paralelamente às correntes Neoparnasianas, o Simbolismo não exerceu, no
Brasil, a função relevante que o distinguiu na literatura européia.
Poesia
Foi, sem a menor sombra de dúvidas, que
podemos afirmar que, se houve Simbolismo no Brasil, este somente se deu a
partir e em virtude de Cruz e Sousa, com a publicação de Broqueis.
A linguagem utilizada por ele foi revolucionaria
de tal forma que os traços parnasianos mantidos acabam por integrar-se num
código verbal novo e remeter a significados igualmente novos.
Um dos recursos morfológicos ou, a
rigor, morfo semânticos, frequentes no autor, é o emprego insólito do
substantivo abstrato no plural capaz de sugerir uma dimensão sensível no
universo das idéias.
Cumpre lembrar ainda que, em virtude de
sua diversidade de tom fluido e expressivo, faz-se necessária a menção do nome
de Alphonsus de Guimaraens.
A difusão do Simbolismo
Como já anteriormente mencionado pela
análise da obra em questão, tem-se como dos principais precursores do
Simbolismo no Brasil a figura de Cruz e Sousa. Entretanto, várias correntes se
seguiram e se dividiram, por diferenciarem quanto a ideais, regiões, e mestres inspiradores,
como é o caso de Emiliano Peneta, simbolista paranaense, Eduardo Guimaraens,
representante da corrente do Rio Grande do Sul, etc.
A Prosa de ficção
Pela origem e natureza da sua estética,
o Simbolismo tendia a expressar-se melhor na poesia do que nos gêneros em
prosa.
Da mole de contos, quadros, fantasias e
devaneios em prosa escritos nessa época, é justo que se ressalvem algumas obras
representativas da forma simbolista. E o caso de Signos, de Nestor Vitor que
trabalha uma linguagem expressionista; Confessor de Mágoas, de Lima Campos; e
Horto de Mágoas, de Gonzaga Duque.
O pensamento crítico
A crítica dos fins do século XIX,
representada pela tríade Sílvio Romero-José Veríssimo- Araripe Jr., foi, em
geral, hostil aos simbolistas. Foi do interior do movimento que nasceram os
critérios conaturais aos valores encarecidos por seus poetas. Daí, terem sido
militantes simbolistas seus melhores críticos: Gonzaga Duque e Nestor Vitor.
Foi somente com Nestor Vitor que a
corrente encontra o seu claro espelho. De espírito aberto às várias tendências
do pensamento e da arte pós-naturalista. Vitor era mais um semeador eclético de
idéias que, a rigor, um crítico dos valores estritamente literários da obra.
VII- Pré-Modernismo e
modernismo - Pressupostos históricos
O que a crítica chama de Modernismo está
condicionado a um acontecimento, como um divisor de águas: A Semana da Arte
Moderna, realizada em Fevereiro de 1922, na cidade de São Paulo.
Dentro de um panorama de Brasil onde
imperava a hegemonia política dos Estados de São Paulo e de Minas Gerais
(política “café com leite”), dentre outros fatores originados pelo pós-guerra,
o intuito da Semana em epígrafe era, nada mais nada menos do que chocar.
Falando de um modo genérico, é a sedução
do irracionalismo, como atitude existencial e estética, que dá o tom aos novos
grupos, ditos modernistas, e lhes infunde aquele tom agressivo com que se opõem
em campo para demolir as colunas parnasianas e o academismo em geral.
Pré-Modernismo
Creio que se pode chamar de
Pré-Modernista tudo o que, nas primeiras décadas do século, problematiza a
nossa realidade social e cultural.
O grosso da literatura foi como é
sabido, pouco inovador. Com isso, torna-se difícil determinar o que foi
realmente o pré-modernismo, cabendo assim aos romances de Lima Barreto e de
Graça Aranha, bem como ao ensaísmo social de Euclides, principalmente, o papel
histórico de mover as águas estagnadas dos fins do século passado e início do
presente.
Dentre todos estes autores cabe-nos
aqui, de acordo com o que já foi analisado anteriormente em cada uma de suas
obras, mencionar algo acerca de:
a) João
Ribeiro com sua crítica independente;
b) Lima
Barreto com seu romance social - Triste
Fim de Policarpo Quaresma;
c) Graça
Aranha, um espírito aberto com Canaã, e
Viagem Maravilhosa.
O Modernismo: Um clima
estético e psicológico
Dado ao clima da época, como já foi dito
anteriormente no início do capítulo em análise, só um grupo fixado na ponta de
lança da burguesia culta poderia renovar efetivamente o quadro literário do
país.
A Semana da Arte Moderna foi o ponto de
encontro desse grupo, e muitos dos seus traços menores. O fato mais importante
antes da Semana foi à exposição de Anita Malfatti em dezembro de 1 917.
Apesar de vários elementos passadistas,
o grupo foi se tornando cada vez mais coeso, no biênio 1920-21, quando se
afirma publicamente pela arte nova.
Para que acontecesse a Semana, tudo já
estava preparado. A coesão do grupo paulista, os contatos deste com alguns
intelectuais do Rio e a adesão do prestigioso Graça Aranha significavam que o
Modernismo poderia lançar-se como um movimento.
Grupos Modernistas nos
estados
Após a Semana e, ao contrário do que
muitos pensam, o Modernismo não se operou somente no: Rio de Janeiro-São Paulo.
Prova cabal disto é o surgimento de grupos no Nordeste, Minas Gerais e outros
Estados da Federação, cujos intelectuais encontravam-se atentos às mudanças
ocorridas na Semana e impetraram também, nestes e em outros Estados às
mudanças advindas com a Semana.
Os Autores e as obras
As inovações atingem os vários estratos
da linguagem literária, desde os caracteres materiais da pontuação e do traçado
gráfico do texto até as estruturas fonéticas, léxicas e sintáticas do discurso.
Vista sob esse ângulo, a “fase heróica”
do Modernismo foi especialmente rica de aventuras experimentais tanto no
terreno poético como no da ficção.
Quanto aos autores, cumpre ainda lembrar
os nomes de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, ManueI Bandeira, Cassiano
Ricardo, Menotti del Picchia, Raul Bopp, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida,
Alcântara Machado, Sérgio Milliet e Paulo Prado que se destacaram dentre os
demais Modernistas da nossa época.
VIII- tendências contemporâneas o
modernismo e o Brasil depois de 30
A Semana foi um acontecimento e uma
declaração de fé na arte moderna. Já o ano de 1930 evoca menos significados
literários prementes por causa do relevo social assumido pela Revolução de
Outubro.
Somos hoje contemporâneos de uma realidade
econômica, social, política e cultural que se estruturou depois de 1930. As
décadas de 30 e 40 vieram ensinar muitas coisas úteis aos nossos intelectuais.
Enfim, o Estado Novo e a II Guerra
Mundial exasperam as tensões ideológicas; e, entre os frutos maduros da sua
introjeção na consciência artística brasileiras contam-se obras-primas com A
Rosa do Povo, Poesia Liberdade, Memórias do Cárcere, etc.
A ficção
Os decênios de 30 e 40 são lembrados
como “a era do romance brasileiro”. E não só de ficção regionalista, mas também da prosa cosmopolita e das páginas de
sondagem psicológica e moral.
Socialismo, freudismo, catolicismo
existencial: eis as chaves que serviram para a definição do homem em sociedade
e sustentariam ideologicamente o romance empenhado desses anos fecundos para a prosa
narrativa.
Tornou-se comum em toda parte uma ficção
aberta, cujo comportamento começou a parecer bem mais fascinante. Difunde-se o
gosto da análise psíquica, da notação moral, de um realismo psicológico bruto
como técnica ajustada há um tempo em que o homem se dissolve na massa: são os
romances; Contemporâneos do facismo, racismo, do stalinismo.
As trilhas do romance:
Uma hipótese de Trabalho
Há uma oposição ego/sociedade que funda
a forma romanesca e a mantém enquanto tal.
Se da parte do herói são várias as
maneiras de atuar a dialética de vínculo e oposição ao meio, no romancista a
consciência que projeta as personagens toma a forma de ironia, modo ambíguo de
propor e, mesmo tempo, transcender o ponto de vista do herói.
Nessa perspectiva poderíamos distribuir
o romance brasileiro, de 30 para cá, em pelo menos quatro pedências, segundo o
grau crescente de tensão entre o “herói” e o seu mundo:
a)
Romances de tensão mínima - há conflito,
mas este se configura em termos de oposição verbal, sentimental quando muito;
b)
Romances de tensão crítica - o herói
opõe-se e resiste agonicamente às pressões da natureza e do meio social;
c)
Romances de tensão interiorizada - o
herói não se dispõe a enfrentar a antinomia pela ação: evade- se subjetivando o
conflito;
d)
Romances de tensão transfigurada - o
herói procura ultrapassar o conflito que o constitui existencialmente pela
transmutação mítica ou metafísica da realidade.
Deste modo, cumpre lembrar os nomes de
alguns autores contemporâneos: José Américo de Almeida, Raquel de Queirós, José
Lins do Rego, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Érico Veríssimo, Marques Rabelo,
José Geraldo Vieira, Lúcio Cardoso, Cornélio Pena, etc.
Permanência e
transformação do Regionalismo
O Nordeste, de onde vieram os clássicos
do neorrealismo, tem concorrido com uma copiosa literatura ficcional, que vai
do simples registro de costumes locais à aberta opção de crítica e engajamento
que as condições da área exigem.
Ao lado desse filão romanesco
neoverista, alguns prosadores têm ensaiado sínteses formais novas que procuram
dar ênfase nos aspectos humanos universais que a matéria provinciana ou rústica
lhe propicia.
A esse tipo de prosa ajustou-se bem o
uso intensivo do monólogo.
Combinando lenda e humor, tradição
popular e paródia, o dramaturgo paraibano Ariano Suassuna surpreendeu seu
público com duas narrativas de fôlego, A Pedra do Reino e O Rei Degolado.
A Poesia
Foi a expressão poética a que mais
pronta e mais radicalmente se alterou com a viragem modernista.
Renovar
a linguagem está no cerne das preocupações e dos projetos de todos.
Faz-se
necessário lembrar os nomes de alguns poetas contemporâneos como é o caso de
Vinícius de Morais, Cecília Meireles, Jorge de Lima, Murilo Mendes, entre
outros.
A Crítica
O Modernismo arejou tudo, beneficiando
também a crítica literária que, continuava a ser, em plena década de 20, uma
fortaleza do academismo neoparnasiano.
Dentre os novos críticos encontram-se
nomes como Tristão de Ataíde, Álvaro Lins, Afrânio Coutinho. Antônio Cândido de
Mello e Souza, além de Otto Maria Carpeaux que aparece hoje como divisor de
águas entre modos de ler menores e, não raro, provincianos, e uma consciência
crítica poderosa da literatura como sistema enraizado na vida e na história da
sociedade.
Colaborou intensamente em alguns jornais
do Rio e de São Paulo, escrevendo artigos e ensaios sobre grandes escritores
estrangeiros que aqui se conheciam pouco ou nada.
Me ajudou bastante. Parabéns !
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