quinta-feira, 11 de julho de 2013

Bosi, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 1983.



I - A condição colonial -  literatura e situação
O problema das origens da nossa Literatura não pode formular-se em termos de Europa, mas nos mesmos termos de outras literaturas americanas, isto é, a partir da afirmação de um complexo colonial de vida e de pensamento.  
Assim, de um lado houve a dispersão do país em subsistemas regionais, até hoje relevantes para a história literária; de outro, a seqüência de influxos da Europa, responsável pelo paralelo que se estabelec e entre os momentos de além-Atlântico e as esparsas manifestações literárias e artísticas do Brasil- Colônia: Barroco, Arcádia, Ilustração, Pré-Romantismo....
A busca de fontes ideológicas não-portuguesas ou não-ibéricas, em geral, já era uma ruptura consciente com o passado e um caminho para modos de assimilação mais dinâmicos, e propriamente brasileiros, da cultura européia, como se deu no período romântico.

Textos de informação
Os primeiros escritos da nossa vida documentam precisamente a instauração do processo: são informações que viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e o homem brasileiro. Enquanto informação, não pertencem à categoria do literário, mas à pura crônica histórica e, por isso, há quem as omita por escrúpulo estético.  
No entanto, a pré-história das nossa letras interessa como reflexo da visão do mundo e da linguagem que nos legaram os primeiros observadores do país. E não só como testemunhos valem estes textos, mas também como sugestões temáticas e formais.  
Alguns dos texto merecem destaque, como é o caso da Carta de Pero Vaz de Caminha, O Diário de Navegação de Pedro Lopes, o Tratado da Terra do Brasil, etc.

A Carta de Caminha
O que para nós representou a Certidão de nascimento do nosso país, era gênero copiosamente representado durante o século XV em Portugal e Espanha: a literatura de viagens, e uma transparente ideologia mercantilista pelo zelo missionário de uma cristandade ainda medieval.

Gândavo
Quanto a Pero de Magalhães Gândavo, português, de origem flamenga, vem-se-lhe os primeiros wiiormes sistemáticos do Brasil: o Tratado.
Trata-se naturalmente de uma objetividade relativa ao universo do autor: humanista, católico, interessado no proveito do Reino. O nativismo aqui como em outros cronistas, situa-se no nível descritivo e não tem qualquer conotação subjetiva ou polêmica.  
Sua atitude em face do índio prende-se aos comuns padrões culturais de português e católico medieval; e vai da observação curiosa ao juízo moral negativo.  
A História termina com uma das tônicas da literatura informativa: a preocupação com o ouro e as pedras preciosas que se esperava existissem em grande quantidade nas terras do Brasil.

O Tratado de Gabriel Soares   
Quanto a Gabriel Soares de Sousa, a crítica histórica tem apontado o seu Tratado Descritivo do Brasil em 1587 como a fonte mais rica de informações sobre a colônia no século XVI.  
O Tratado consta de duas partes: “Roteiro Geral com Largas Informações de Toda a Costa do Brasil, de caráter geo-histórico e bastante minucioso; e o “Memorial e Declaração das Grandezas da Bahia de Todos os Santos, de sua Fertilidade e das Outras Partes que Tem”


A Informação dos Jesuítas
Paralelamente à crônica leiga, aparece dos jesuítas, tão rica de informações e com um quê de intenção pedagógica e moral.  
De Nóbrega, temos o “Diálogo sobre a Conversão do Gênio”, documento notável pelo equilíbrio com que o sensato jesuíta apresentava os aspectos “negativos” e “positivos” do índio, do ponto de vista da sua abertura à conversão. 
Mas é o Anchieta, poeta e dramaturgo que interessa ao estudioso da incipiente literatura colonial. E se os seus autos são definitivamente pastorais, destinados à edificação dos índios e do branco em certas cerimônias litúrgicas, o mesmo não ocorrem com seus poemas que valem como estruturas literárias. 
A linguagem molda-se na tradição medieval espanhola e portuguesa. Pode-se dizer mesmo que o vetor afetivo de Anchieta é a consolação pelo amor. Quanto aos autos atribuídos a Anchieta, deve-se insistir na sua menor autonomia estética: são obra pedagógica, que chega a empregar ora o português, ora o tupi, conforme o interesse ou o grau de compreensão do público a doutrinar.  
Os autos de Anchieta, como os mistérios e as moralidades da Idade Média. materializam nas figuras fixas dos anjos e dos demônios os pólos do Bem e do Mal, entre os quais oscilaria o cristão; daí o seu realismo, que à primeira vista parece direto e óbvio, ser, no fundo, alegoria.

Da crônica à história: Frei Vicente, Antonil 
Nem sempre é fácil distinguir a crônica da história quando se lida com textos coloniais. Um balanço da prosa do primeiro século e meio de vida colonial dá-nos elementos para dizer que o puro caráter informativo referencial predomina e pouco se altera até o advento do estilo barroco.

II- Ecos do Barroco  - Barroco: Espírito e estilo  
 Seja qual for a interpretação que se dê ao barroco, é sempre útil refletir sobre a sua situação de estilo pós-renascentista e, nos países germânicos, pós-reformista.       
É na estufa da nobreza e do clero espanhol, português e romano que se incuba a maneira barrocojesuítica: trata-se de um mundo já em defensiva, organicamente preso Contrarreforma e ao Império filipino, e em luta com as áreas liberais do Protestantismo e do racionalismo crescente na Inglaterra, na Holanda e na França.
É instrutivo observar que o Barroco-jasuítico não tem nítidas fronteiras espaciais, mas ideológicas. Floresce em vários países da Europa, mas já não se reconhece nas sóbrias estruturas da arte coetânea da Suécia e da Alemanha cujo “barroco” luterano é infenso a extremos gongóricos da imagem e do som.
Em suma, desvalorizar um poema barroco porque “vazio” ou mitizá-lo porque rebuscadamente estilizado é, ainda e sempre, cometer o pecado de isolar espírito e forma, e não atingir o plano da síntese estética que deve nortear, em última instância, o julgamento de uma obra.
Suposto no artista barroco um distanciamento da práxis, entende-se que a natureza e o homem se constelassem na sua fantasia como quadros fenômenos instáveis.
O que importa, pois, é não nomear plebelamente o objeto, mas envolvê-lo em agudezas e torneios de engenho, critérios básicos de valor na arte consciente.
O limite inferior dessa arte é o cerebrino.  
O rebuscamento em abstrato é sem dúvida o lado estéril do Barroco e o seu estiolar-se em barroquismo.
O primeiro passo para o deslinde da morfologia barroca foi dado pelo historiador de arte Heinrich Woelfflin, cujo texto “Renaissance und Barok” abriu uma nova problemática que ainda hoje preocupa os estudiosos da forma. Mas só nos “Conceitos Fundamentais de História da Arte” definiria a passagem a passagem ideal do clássico ao Barroco em termos de uma passagem.

A possibilidade de formas de expressão esfumadas,  ambíguas, não-finitas  
Todos estes caracteres quadram bem a um estilo voltado para a alusão e para a ilusão enquanto fuga da realidade convencional.  É de esperar que os recursos dessa visão do mundo sejam, na poesia, as figuras: sonoras, sintáticas, e, sobretudo semânticas. enfim todos os processos que reorganizam a linguagem comum em função de uma nova realidade: a obra, o texto. a composição.

O Barroco no Brasil 
No Brasil houve ecos do Barroco Europeu durante os séculos XVII e XVIII.  
Na segunda metade XVIII, porém, o ciclo do ouro já daria um substrato material à arquitetura, à escultura e à vida musical, de sorte que parece lícito falar de um “Barroco Brasileiro” e, até mesmo, mineiro. Alguns trabalhos do Aleijadinho, de Manuel da Costa Ataíde, e composições sacras de Lobo de Mesquita. 
A poesia coetânea delas já não é, senão residualmente, barroca, mas rococó, arcádica e neoclássica, havendo  portanto uma discronia entre as formas expressivas.

Autores e obras  - A “Prosopopéia” de Bento Teixeira
O poemeto em oitavas heróicas “Prosopopéia” de Bento Teixeira, publicada em 1601, pode ser considerado um primeiro e canhestro exemplo de maneirismo nas letras da Colônia.  
A imitação de “Os Lusíadas” é assídua, desde a estrutura até o uso dos chavões da mitologia e dos torneios sintáticos. O que há de não português no poemeto, como a “Descrição do Recife de Pernambuco”, “Olinda Celebrada” e o canto dos feitos de Albuquerque Coelho, entra a título de louvação à terra enquanto colônia.

Gregório de Matos 
 Poesia muito mais rica, que interessa não só como documento da vida social dos Seiscentos, mas também pelo nível artístico que atingiu.  
Contrastes da produção literária: a sátira mais irreverente com a contrição do poeta devoto; a obscenidade do “capadócio”. O desejo de gozo e da riqueza são mascarados formalmente por uma retórica nobre e moralizante, mas afloram com toda brutalidade nas relações com as classes servis que delas saem mais aviltadas. Daí, o “populismo” chulo que irrompe às vezes e, longe de significar uma atitude antiaristocrática, nada mais é que válvula de escape para velhas obsessões sexuais ou arma para ferir os poderosos invejados.
Gregório moteja aqueles senhores de engenho que, já mestiçados de português e tupi, presumiam igualar-se em prosápia com a velha nobreza branca que formaria o “antigo estado” da Bahia.
Alguns de seus sonetos sacros e amorosos transpõem como brilho esquemas de Gángora e de Quevedo e valem como exemplo do gosto seiscentista de compor símiles e contrastes para enfunar e destrinçar conceitos.
Em toda a sua poesia o achincalhe e a denúncia encorpam-se e movem-se à força de jogos sonoros, de rimas burlescas de uma sintaxe apertada e ardida, de um léxico incisivo, quando não retalhante; tudo o que dá a seu estilo uma verve não igualada em toda a história da sátira brasileira posterior.

Botelho de Oliveira
Estamos diante de um poeta literato stricto sensu, capaz de escrever com igual perícia em quatro idiomas e nas várias formas fixas herdadas ao trovadorismo e aos renascentistas: sonetos, madrigais, redondilhas, romances, epigramas, oitavas, décimas...O virtuosismo em Botelho apela abertamente para os modelos da época.
Parece-me, porém, útil insistir em duas matrizes que subjazem aos diversos processos estilísticos de Botelho, pois valem para o gongorismo em geral. A primeira reside no princípio da analogia em geral desfrutado em todas as suas possibilidades.
A analogia, aproximando palavras em função de suas camadas sensíveis ou lógicas, também conduz a colagens de substantivos e adjetivos cujo efeito é o puro insólito.             
Outra constante da linguagem marinista é o acentuar dos contrastes, reduzindo-os ao paradoxo, isto é, à violenta junção dos opostos.


A Prosa Vieira
A prosa branca está representada em primeiro plano pela oratória sagrada dos jesuítas. O nome central é o de Padre Antônio Vieira.
Existe um Vieira brasileiro, um português e um europeu, e essa riqueza de dimensões deve-se não apenas ao caráter supranacional da Companhia de Jesus que ele tão bem encarnou, como à sua estrutura humana em que não me parece exagero reconhecer traços de gênio   
No seu espírito verdadeiramente barroco fermentavam as ilusões do estabelecimento de um Império luso e católico, respeitado por todo o mundo e servido pelo zelo do rei, da nobreza, do clero. Como intérprete fantasioso dos textos bíblicos em função do sebastianismo popular, vê frustradas as suas profecias além de trair suspeitas para as suas obras “heréticas”.
De Vieira ficou o testemunho de um arquiteto incansável de sonhos e de um orador complexo e sutil, mais conceptista do que cultista, amante de provar até o sofisma, eloqüente até à retórica, mas assim mesmo, ou por isso mesmo, estupendo artista da palavra.
Ao leitor brasileiro interessam particularmente: “O Sermão da Primeira Dominga da Quaresma”.
Não se diga que foi insensível ao escravo negro preterindo-o no ardor de defesa indígena. No “Sermão XIV do Rosário”, pregado em 1633 à Irmandade dos Pretos de um engenho baiano, ele equipara os sofrimentos de Cristo ao dos escravos.

Prosa alegórica
Curioso exemplo de prosa narrativa barroca deparamos no Compêndio Narrativo de Peregrino da América. Trata-se de uma longa alegoria dialogada, muito próxima do estilo dos moralistas espanhóis e portugueses que trocaram em miúdos os princípios estéticos da Contrarreforma.
A paisagem que serve de fundo aos diálogos é um misto de realismo e alegoria.
O romance didático foi também cultivado por Teresa Margarida da Silva. A rigor, não pertenceria à nossa literatura apesar de ter sido chamada a “precursora do romance brasileiro”. Em meados do século XVIII, ultrapassa os limites do Barroco não só histórica mas ideologicamente: o conteúdo das suas alegorias tem já um sabor iluminista; e atrás de uma prosa ainda afetada de cultismos entrevê-se o amor à ordem, à simplicidade e às virtudes racionais que a ciência e a nova pedagogia afrancesada vinham pregando.

As academias
Das Academias brasileiras pode-se dizer que foram o último centro irradiador do Barroco literário; o primeiro sinal de uma cultura humanística viva, extraconvencional, em nossa sociedade.
Foram às baianas as academias mais fecundas, com alguma relevância às do Rio de Janeiro.
Ao lado destas instituições podem-se citar os “atos acadêmicos”, sessões literárias que duravam algumas horas e tinham por fim celebrar datas religiosas ou engrandecer os feitos de autoridades coloniais.
Cumpre ainda falarmos sobre a “Academia Brasílica dos Esquecidos”, cujos planos era estudar a história natural, militar, eclesiástica, e política do Brasil e discutir nas sessões os versos compostos pelos acadêmicos.
Os Esquecidos foram cerebrinos fazedores de acrósticos e mesósticos, sonetos joco-sérios e plurilíngues, centões bestialógicos e até engenhos pré-concretos.
As academias e os atos acadêmicos significam que a Colônia já dispunha, na primeira metade do século XVIII, de razoável consistência grupal. E embora se tenham restringido a imitar os sestros da Europa barroca, já puderam nutrir-se da história local.
Nas esferas ética e cultural está ainda por fazer-se o inventário da herança colonial-barroca em toda a América Latina. Entre os caracteres mais ostensivos lembrem-se: o meufanismo verbal, com toda a sequela de discursos familiares e acadêmicos; a anarquia individualista, que acaba convivendo muito bem com o mais cego despotismo; a religiosidade dos dias de festa; a displicência em matéria de moral; o vício do genealógico e do heráldico nos conservadores; o culto da aparência e do medalhão; o vezo dos títulos; a educação bacharalesca das elites; os surtos de antiquarismo a que não escapam nem mesmo alguns espíritos superiores.
Esses traços se desenvolveram com as estruturas sociais que presidiram à formação de nossas elites e têm reaparecido sempre que o processo de modernização se interrompe ou cede á força da inércia.

III - Arcádia e Ilustração - Dois Momentos: O Poético E O Ideológico
A passagem do barroco ao “barrocheto” e ao rococó foi um processo estilístico interno na história da arte do século XVIII e consistiu em uma atenuação dos aspectos pesados e maciços dos Seiscentos. Nessa viragem prefiguram-se as tendências estéticas do Arcadismo como busca do natural e do simples e adoção de esquemas rítmicos mais graciosos, entendendo-se por graça uma forma específica e menor de beleza.
O que já se postulava no período áureo do barroco em nome do equilíbrio e do bom gosto entra, no século XVIII, a integrar todo um estilo de pensamento voltado para o racional, o claro, o regular, o verossímil.
Importa, porém distinguir dois momentos ideais na literatura dos Setecentos: a) momento poético que nasce de um encontro, embora ainda amaneirado, com a natureza e os afetos comuns do homem, refletidos através da tradição clássica e de formas bem definidas, julgadas dignas de imitação; b) o momento ideológico, que se impõe no meio do século e traduz a crítica da burguesia culta aos abusos da nobreza e do clero.
Denominador das tendências arcádicas é a busca do verossímil. Segundo essa linha de pensamento, os mitos gregos, valem como belas aparências do real, do mesmo real que a filosofia cartesiana atinge com as seus conceitos.
É sabido que ambientes e figuras bucólicas povoaram os versos dos autores setecentistas. O bucolismo foi para todos o ameno artifício que permitiu ao poeta fechado na corte abrir as janelas para um cenário idílico onde pudesse cantar, liberto das constrições da etiqueta, os seus sentimentos de amos e de abandono ao fluxo da existência.
Há um ponto nodal para compreender o artifício da vida rústica na poesia arcádica: o mito do homem natural cuja forma extrema é a figura do bom selvagem.
No Arcadismo brasileiro, os traços pré-românticos são poucos, espaçados embora às vezes expressivos, como em uma ou outra lira de Gonzaga, em um outro rondó de Silva Alvarenga. Em nenhum caso, porém, rompem o quadro geral de um Neoclassicismo mitigado onde prevalecem temas árcades e cadências rococós.
O gosto da clareza e da simplicidade graças ao qual puderam superar a pesada maquinaria cultista; os mitos do homem natural, do bom selvagem, do herói pacífico.

Os autores e as obras - Cláudio Manuel da Costa  
Mais de um fator concorreu para que este fosse o nosso primeiro poeta neoclássico: a sobriedade do caráter, a sólida cultura humanística, a formação literária portuguesa e italiana e o talento de versejar compuseram em Glauceste Satúrnio o perfil do árcade por excelência.
O gosto melhor tem por vigas o motivo bucólico e as cadências do soneto camoniano.
Não é ainda necessariamente sinal de pré-romantismo.
Cláudio tento, com menor êxito, a poesia narrativa e compôs a Fábula do Ribeirão do Carmo e o poemeto épico Vila Rica. Ambos são curiosos documentos da oscilação que sofria o escritor entre o prestígio da Arcádia e as suas montanhas mineiras.

Basílio da Gama
Possui a mesma ambivalência e o mesmo esforço no trato com a palavra. No seu Uruguai, prevalecem o verso branco e o balanço entre os decassílabos heróicos e sáficos aligeiram a estrutura do poema que melhor se diria lírico-narrativo do que épico.
É o aqui e agora que urge sobre a sensibilidade de Basílio.
A natureza é colhida por imagens densas e rápidas; não são já mero arcadismo, mas caminho para o paisagismo romântico.
Esse móvel pano de fundo, que às vezes vale por si próprio deslocando-se para o primeiro plano da tessitura narrativa, é a novidade de Basílio no trato da epopéia.

Santa Rita Durão
No Caramuru de Fr. José de Santa Rita Durão o índio é matéria prima para exemplificar certos padrões ideológicos. Mas será uma corrente oposta à de Basílio, voltada para o passado jesuítico colonial.
Se, pela cópia de alusões à flora brasileira e aos costumes indígenas, o Caramuru parece dotado de índole mais nativista do que o Uraguai, no cerne das intenções e na estrutura, a epopéia de Durão está mais distante do homem americano do que o poemeto de Basílio.
A poética que presidiu à feitura do poema era híbrida. De um lado, esquemas camonianos, “corrigidos” pela presença exclusiva do maravilhoso cristão. De outro, a tradição colonial-barroca que se reflete no gosto das enumerações profusas da flora tropical.
No conjunto, porém, a sua extrema fidelidade aos módulos clássicos e às hierarquias mentais da Contrarreforma insere-o de pleno direito na linguagem conservadora que em Portugal resistiu à maré iluminista.

Árcades Ilustrados: Gonzaga, Silva Alvarenga, Alvarenga Peixoto
Há um ar de família que nos faz reconhecer em Basílio e nesses poetas a mesma disposição constante para atenuar em idílio tudo o que é tenso conflitante: o sentimento, mediado pela maneira bucólica e rococó, é comum a todos. É comum o convívio com o Iluminismo que levou os últimos à participação em grupos hostis ao regime. Gonzaga e Alvarenga Peixoto estiveram na Inconfidência.
Gonzaga é conaturalmente árcade. Para os românticos, que levariam o processo ao limite, a natureza era o lugar sagrado da paixão, o cenário divino dos seus próprios sonhos de liberdade e de glória. Mas para o árcade ela ainda é pano de fundo.
Nas liras compostas no cárcere, o desejo de temperar as próprias dores com novas galanterias e torneios mitológicos é prova de um caráter incapaz de extremos.
Escreveu Cartas Chilenas no intuito de satirizar seu desafeto político.
Nas obras de Alvarenga Peixoto acham-se traços esparços, mas fortes, de nativismo. Em geral, combina a loa do progressismo com a aceitação do governo forte: é o déspota ilustrado o seu ideal, tirano a quem se rende a Colônia na pessoa do nativo.
Quanto ao juízo estético sobre a lírica de Alvarenga Peixoto, está pendente de poucas composições, sendo algumas de autoria discutível.
Silva Alvarenga dá-nos a imagem cabal do militante ilustrado. Mas a atenção do leitor amante da poesia logo se voltará para a coerência formal de sua obra, Glaura, composta de rondós e madrigais.
Último dos neoclássicos de relevo, já foi considerado, no entanto “o elo que prende os clássicos aos românticos”. É verdade também que jogar com as linhas e as cores da paisagem para exprimir os próprios afetos é ser pré-romântico em sentido lato.

Da Ilustração ao Pré-Romantismo
Nos primeiros decênios do século XIX as fórmulas arcádicas servem de meio, cada vez menos adequado, para transmitir os desejos de autonomia que a inteligência brasileira já manifestava em diversos pontos da Colônia.
Uma hipótese para explicar o fenômeno é ver o hibridismo cultural ideológico desse período a carência de mordente capaz de organizar um estilo forte e duradouro.
O ecletismo teve nos gêneros públicos e na poesia retórica a sua melhor expressão.
Por poesia retórica entende-se aqui o verso que se propõe abertamente ensinar, persuadir, moralizar; em suma, incutir um complexo de idéias e sentimentos. O Iluminismo favorecia o gosto pedagógico, ministrando o útil, enquanto cabia ao idílio árcade providenciar o agradável. Com o nosso hibridismo ilustrado-religioso do começo do século XIX, é o poema sacro, moralizante ou patriótico que vai substituir as tiradas em prol das luzes do século anterior.



Os Gêneros Públicos
Ao lado dessa poesia, oscilante entre velhos e novos padrões, florescem os gêneros nascidos da aberta inserção na vida pública; o sermão, o artigo, o discurso, o ensaio de jornal.
Articularam-se as nossa letras ante-românticas e se definiram as linhas ideológicas mestras do Primeiro Império e da Regência.
Variam as tônicas no panfleto ou no sermão conforme as raízes leigas ou religiosas.
Variavam também os objetos a que se aplicava a idéia. Representam o liberalismo de centro dois admiráveis publicistas da época, Hipólito da Costa Pereira e Evaristo da Veiga. Cada um à sua maneira criou molde brasileiro da prosa jornalística de ideias. Para ambos, a liberdade é, acima de tudo, possibilidade de expressão, de informação, de crítica. São os clássicos do respeito aos direitos civis, à Constituição. Diferem em grau. Difere também pelas próprias circunstâncias de tempo em que atuaram. A prosa de Hipólito é a do ensaísmo ilustrado. A de Evaristo cinge-se à crônica política que tempera como pode as reações ao imprevisto.
Influência e, mais que influência, fascínio, exerceu a palavra de um orador sagrado, Frei Francisco de Monte Alverne, que carreou para o limiar do Romantismo uma nova sensibilidade. Foi ele quem primeiro sentiu a inflexão espiritualista da Europa romântica.

IV-O Romantismo - Caracteres Gerais 
O amor e a pátria, a natureza e a religião, o povo e o passado, que afloram tantas vezes na poesia romântica, são conteúdos brutos, espalhados por toda a história das literaturas, e pouco ensinam ao intérprete do texto, a não ser quando opostos em situação, tematizados e lidos como estruturas estéticas.

A situação dos vários romantismos
O Romantismo expressa os sentimentos dos descontentes com as novas estruturas: a nobreza, que já caiu, e a pequena burguesia que ainda não subiu: de onde, as atitudes saudosistas ou reivindicatórias que pontuam todo o movimento.
Assim, apesar das diferenças de situação material, pode-se dizer que se formaram em nossos homens de letras configurações mentais paralelas às respostas que a inteligência européia dava a seus conflitos ideológicos.
Os exemplos mais persuasivos vêm dos melhores escritores. O romance colonial de Alencar e a poesia indianista de Gonçalves Dias nascem da aspiração de fundar um passado mítico a nobreza recente do país.
Como os seus ídolos europeus, os nossos românticos exibem fundos traços de defesa e evasão, que os leva a posições regressivas: no plano da relação com o mundo e no das relações com o próprio eu.
O fulcro da visão romântica do mundo é o sujeito, que é o emissor da mensagem.
A natureza romântica é expressiva. Ao contrário da natureza árcade, decorativa. Prefere-se a noite ao dia, pois à luz crua do sol impõe-se ao indivíduo, mas é na treva que latejam as forças inconscientes da alma: o sonho, a imaginação.
A nação afigura-se ao patriota do século XIX como uma idéia-força que tudo vivifica. Acendra-se o culto à língua nativa e ao folclore.
O homem romântico reinventa o herói, que assume dimensões titânicas, sendo afinal reduzido a cantor da própria solidão.
A renovação nas camadas sonora atingiu o cerne do verso, o ritmo, distendendo-o em função da melodia que, veículo mais adequado às efusões do sentimento, contou com a preferência dos poetas e, naturalmente, dos compositores:
Renascem, por outro lado, formas medievais de estrofação e dá-se o máximo relevo aos metros breves, de cadência popular, os redondilhos maiores e menores, que passam a competir com o nobre decassílabo.
Gênero entre todos contemplado foi o romance, os românticos acresceram-lhes a ficção histórica e o romance egótico-passional, formas acessíveis ao novo público leitor composto principalmente de jovens e de mulheres, ansioso de encontra na literatura a projeção dos próprios conflitos emocionais. O romance foi, a partir do Romantismo, um excelente índice dos interesses da sociedade culta e semiculta do Ocidente. A sua relevância no século XIX se compararia, hoje, à de cinema e da televisão.
O Romantismo oficial no Brasil - Gonçalves de Magalhães
Coube alguns escritores da segunda plana a introdução do Romantismo como programa literário no Brasil.
O nome de Gonçalves de Magalhães é tradicionalmente lembrado pela baliza da publicação dos Suspiros Poéticos e Saudades, livro e data que a história fixou para a introdução do movimento entre nós.
A relevância histórica reside no fato de Magalhães não ter operado sozinho como imitador de Lamarti e Manzoni, mas de ter produzido junto a um grupo, visando a uma reforma da literatura brasileira.
João Caetano compôs a primeira tragédia escrita por um brasileiro e único de assunto nacional.
Tendo nos dado o lírico e o dramático, faltava-lhe o épico: fê-lo retomando Durão e Basílio, lidos se um ângulo enfaticamente nativista, e compôs a Confederação dos Tamoios.

Porto Alegre
O principal companheiro de Magalhães no grupo de Niterói de nada o ultrapassou: Manuel de Araújo Porto Alegre. Reuniu seus poemas nas Brasilianas, escritas com o intuito confesso de acompanhar o Sr. Magalhães na reforma da arte por ele feita em 1836.

A Historiografia
O índio, fonte de nobreza nacional, seria, em princípio, o análogo do bárbaro. O Romantismo refez sua semelhança à imagem da Idade Média, conferindo-lhe caracteres “romanescos” de que se nutriu largamente a fantasia de poetas, narradores e eruditos durante quase meio século.
Esse complexo ideo-afetivo não abarca todo o Romantismo, mas uma área bem determinada como classe e como tendência intelectual.
O nosso indianismo de Varnhagen a Alencar, pendeu para o extremo conservador, como todo o contexto social e político do Brasil dos fins da Regência à década de 60.

Teixeira e Sousa
A este deve-se o primeiro romance brasileiro: O Filho do Pescador. É como narrador folhetinesco que nos interessa. O romance de capa-e-espada, as novelas ultra-românticas e os dramalhões, chancelados por hábeis manejadores de pena como Eugène Sue, Scribe, etc., foram os modelos, diretos ou não, de Teixeira e Sousa. Oculto da peripécia em todos os seus romances produz sempre a justaposição, único modo de levar adiante o romance: acidentes, reconhecimentos, avanços e retornos, até que o processo sature o autor e o leitor e dê por findo o passatempo. Seja como for, foi com ele que o Romantismo caminhou para a Narração.

A poesia - Gonçalves Dias
Foi o primeiro poeta autêntico a emergirem nosso Romantismo. A sua  personalidade de artista soube transformar os temas comuns em obras poéticas duradouras.
Mas é preciso ver na força de Gonçalves Dias indianista o ponto exato em que o mito do bom selvagem, constante desde os árcades, acabou por fazer-se verdade artística.
Para a primeira geração romântica, porém, presa a esquemas conservadores, a imagem do índio casava-se sem traumas com a glória do colono que se fizera brasileiro, senhor cristão de suas terras e desejoso de antigos brasões. E a perspectiva sua até a última sua produção indianista.
Um dos caracteres da poesia americana de Gonçalves Dias, e que as distancia da frouxidão das experiências anteriores, é a entrada súbita de vigor de selvagem desejado.
O exemplo de Gonçalves Dias artífice do verso sobrevive aos românticos e toca os parnasianos.
A sua lírica singulariza-se no conjunto da poesia romântica brasileira como a mais literária, isto é, a que melhor exprimiu o caráter mediador entre os pólos da expressão e da construção. Ele é o clássico do Romantismo.


O romantismo Egótico: A 2ª Geração
Na segunda geração romântica, a poesia brasileira percorrerá os meandros do extremo subjetivismo. Alguns poetas adolescentes, mortos antes de tocarem a plena juventude, darão exemplo de toda uma temática emotiva de amor e morte, dúvida e ironia, entusiasmo e tédio.
Romantismo quer dizer, antes de mais nada, um progressivo dissolver-se de hierarquias em estados de alma individuais.
A poesia de Álvares de Azevedo e a de Junqueira Freire oferecem rica documentação para a psicanálise.

Álvares de Azevedo
Foi o escritor mais bem dotado de usa geração. Em vários níveis se apreendem as suas tendências para a evasão e para o sonho. A camada dos sonhos compõe ritmos frouxos, melodias lânguidas e fáceis que se prestam antes à sugestão de atmosferas que o recorte nítido de ambientes.
As comparações e as metáforas traduzem no concreto das imagens naturais os mesmos sentimentos básicos: a flor desfolhada lembra a juventude sem viço; o sussurro da brisa semelha o suspiro do amante; e “as ondas são anjos que dormem no mar”.
Nessa literatura a fusão de libido e instinto de morte, caminhava na esteira de um Romantismo em progresso enquanto trazia à luz da contemplação poética os domínios obscuros do inconsciente.

Junqueira Freire
É precisamente esse convívio tenso entre eros e thanatos que sela a personalidade do religioso e do artista malogrado.
Cria um estilo viril que nada deve aos clássicos em rigor e precisão: essa era a “art romantique” rica de sons e de imagens, de movimento e de tensão, que Baudelaire cultuava como fonte de seu próprio estilo. Dela nada existia em Junqueira Freire.

Laurindo Rabelo
As fontes populares estavam presentes no “poeta lagartixa” e poeta de salão. Por isso mesmo representativo do gosto romântico médio do Brasil Império.
A trova, os redondilhos, as rimas emparelhadas são os seus meios de expressão congenitais, e, na mesma linha de simplicidade, são as flores que lhe oferecem material copioso para enumerações e metáforas.
Contorce aqui e lá a dicção, à procura de uma graça decorativa que possa produzir efeito entre os seus ouvintes cultos ou pseudocultos.
Sua obra pode ser uma das balizas para um estudo que a nossa cultura reclama: o das relações entre a linguagem do povo, da classe média e dos grupos de prestígio nos meios urbanos.

Casimiro de Abreu
Operou uma descida de tom em relação à poesia dos anteriores. O que singulariza o poeta é o modo de compor, que remonta, em última análise, ao seu modo de conhecer a realidade na linguagem e pela linguagem.
Reduzia a natureza e o próximo a um ângulo menor: o do seu temperamento sensual e menineiro que o aproxima bastante dos literatos fluminenses coevos.
Em tudo Casimiro é menor. Os seus versos agradaram, e creio que ainda possam agradar aos que pedem pouco à literatura: um ritmo cantante, uma expressão fácil, uma palavra brejeira.

Epígonos
Nos anos de cinqüenta, um grupo realmente novo pelo espírito e pela forma, encontram-se os epígonos, que retomam o americanismo ou as efusões sentimentais.



Varela
O epígono por excelência, foi, sem dúvida, Fagundes Varela. O único nome de relevo na poesia da década de 60.
Mais que os seus modelos, sensível à lira patriótica de filiação liberal: índice de uma tendência que inverteu, a partir de 60, aquele signo áulico manifesto no coro dos contentes.
Prenuncia os condoreiros pelo ardor nacionalista, no tratamento precoce do tema do negro em relação à literatura abolicionista dos decênios seguintes.
Quando o poeta publica seu melhor livro - Cantos e Fantasias - começa a fazer-se conhecido um dos maiores poetas do nosso Romantismo, Antônio de Castro Alves.
A sua estréia coincide com o amadurecer de uma situação nova: a crise do Brasil puramente rural e o firme crescimento da cultura urbana. Outros são agora os modelos poéticos.
Castro Alves será novo pelo epos libertário, bem como nos seus versos de substância amorosa pela franqueza no exprimir seus desejos e os encantos da mulher amada. Com ele fluem sem meandros as correntes de uma renovada lírica erótica.
A indignação, móvel profundo de toda arte revolucionária, tende, na poesia de Castro Alves, a concretar-se em imagens grandiosas que tomam à natureza, à divindade, à história personalizada o material para metáforas e comparações.
E nenhum mito mais eloqüente para a expressão do herói romântico do que o mito de Titã.
Os seus símiles são quase sempre tomados aos aspectos da natureza que sugerem a impressão de imensidade, de infinitude. Porém, nele, nem tudo é hiperbólico.

“Condores”
Vários poetas coetâneos de Castro Alves, ou vindos pouco depois, servem de documento para a história dos sentimentos liberais e abolicionistas que, a partir de 70, dominaram a nossa vida pública.

Sousândrade
Um espírito originalíssimo para seu tempo. Romântico da segunda geração notava-se nele um maior cuidado na escolha do léxico e no meneio sintático.
Mas o pedantismo ainda acerbo das Harpas não significava, nesse talento dinâmico, apenas um resquício purista: era prenúncio do escritor atento às técnicas de dicção, e que seria capaz de manejar com a mesma ductibilidade as fontes e os compostos do jargão yankee.
Outra novidade de Sousândrade em relação a toda a poesia brasileira do século XIX reside nos processos de composição: de insólitos arranjos sonoros ao plurilinguismo; dos mais ousados conjuntos verbais à montagem sintática.

A Ficção
Não se registrou nenhuma evolução no fato de Alencar ter escrito primeiro Lucíola e depois O Gaúcho. O deslocar-se do eixo geográfico deu-se pela própria dispersão, no tempo e no espaço, em que viviam os escritores.
As tentações de ordenar os romances a partir de dados externos explicam-se pela natureza do gênero. Por isso, todo o critério abstrato de progresso pode ser fatal ao julgamento de um romancista.
Pode ser estranho, se não perigoso resíduo idealista, separar os métodos que abordam os consumidores da obra dos que visam entender os seus produtores.
A escala de valores já ficou sugerida atrás; a obra será tanto mais válida, esteticamente, quanto melhor souber o autor usar a margem de liberdade que lhe permitirem as pressões psicológicas e sociais.




Macedo
A cronologia manda começar pelo Romance de Joaquim Manuel de Macedo. Autor de A Moreninha, diluí-las em mais dezessete romances. Em todos eles o gosto do puro romanesco é importado, mas são nossos os ambientes, as cenas, os costumes, os tipos, em suma, o documento.
Percebe-se nele uma carência de realidade moral não compensada pela cópia de traços pitorescos e pelas digressões sentimentais.
Sub-romancista pela pobreza da fantasia, sub-romântico pela míngua do sentimento. Faltava a Macedo o senso vivo do ridículo em que as convenções enredam o homem comum.

Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um Sargento de Milícias estão isentas de qualquer traço idealizante e procuram despregar-se da matéria romanceada graças ao método objetivo de composição, próximo do que seria uma crônica histórica cujo autor se divertisse em resenhar as andanças e os pecadilhos do uomo qualunque.
Em Manuel, o compromisso é mais alto e legítimo, porque se faz entre o relato de um momento histórico e uma visão desenganada da existência, fonte de humor difuso no seu único romance.
O seu valor reside principalmente em ter captado, pelo fluxo narrativo, uma das marcas da vida na pobreza, que é perpétua sujeição à necessidade, sentida de modo fatalista como o destino de cada um.
Esta obra nos dá uma idéia da vida familiar brasileira nos meios urbanos em uma fase em que já se esboçava uma estrutura não tão mais puramente colonial, mas ainda longe do quadro industrial burguês.

Alencar
Merece o lugar de centre pela natureza e expressão de sua obra. Em Sonhos d’Ouro, traçou um quadro retrospectivo da sua ficção, onde se mostrara consciente de ter abraçado todas as etapas da vida brasileira.
Essas linhas indicam que pretendia cobris com sua obra narrativa passado e presente, cidade e campo, litoral e sertão, e compor uma espécie de suma romanesca do Brasil. No entanto, seus vinte e um romances possuem traços visceralmente românticos.
O Romantismo de Alencar é, no fundo, ressentido e regressivo, o que lhe dá sentido na história da nossa cultura e ajuda a explicar muitas das suas opções estéticas.
Para dar forma ao herói, não via meio melhor do que amalgamá-lo à vida da natureza. O tropismo para a vida natural é a outra face da aversão que o romancista votava ao progresso.
O Brasil ideal, para ele, seria urna espécie de cenário selvagem, onde expulsos os portugueses, reinariam capitães altivos, senhores de baraço e cutelo rodeados de sertanejos e peões, livres sim, mas fiéis até a morte.
O escritor que idealizara heróis míticos no coração da floresta é o mesmo que sabe recortar as figuras gentis de donzelas e mancebos nos salões da Corte e nos passeios da Tijuca.
Ao descrever a natureza e os ambientes internos, é tão preciso como qualquer prosador do fim do século.

Sertanistas. Bernardo Guimarães, Taunay, Távora
São regionalistas. As várias formas de sertanisrno que têm sulcado as nossas letras desde meados do século passado, nasceram do contato com de urna cultura citadina e letrada com a matéria bruta do Brasil rural, provinciano e arcaico.
Era o amor que estava presente nas intenções dos sertanistas românticos.
O regionalismo de Bernardo Guimarães mistura elementos tomados à narrativa oral, os “causos” e as “estórias” de Minas e Goiás, com uma boa dose de idealização.
As obras mais lidas de Bernardo, O seminarista e A Escrava Isaura, devem a sua popularidade menos a um progresso na fabulação ou no traçado das personagens do que à garra dos problemas explícitos: o celibato no primeiro e a escravidão no segundo.
O Seminarista está na linha do romance passional. Já A Escrava Isaura, foi chamado A Cabana do pai Tomás nacional.
Visconde de Taunay tinha condições de dar ao regionalismo romântico a sua versão mais sóbria. Foi capaz de enquadrar a história de Inocência em um cenário e em um conjunto de costumes sertanejos onde tudo é verossímil. Sabia explorar na medida justa o cômico dos tipos. No âmbito de nosso regionalismo, romântico ou realista, nada há que supere Inocência em simplicidade e bom gosto.
Com a obra O gaúcho, Franklin Távora quis introduzir, já no apagar das luzes da ficção romântica, um critério mais rigoroso de verossimilhança.
Não cumpriu com Cabeleira sua promessa de uma literatura nordestina. Literariamente, é uma sofrível mistura de crônica do cangaço e expedientes melodramáticos.
Os manifestos e os prólogos de Távora podem ser lidos como sinal avançado dos riscos que o provincianismo traz para a literatura; ou, num plano histórico, como sintoma dos fundos desequilibrados que já no século XIX sofria o Brasil como nação desintegrada, incapaz de resolver os contrastes regionais e à deriva de uma política de preferências econômicas fatalmente injusta.

O Teatro - Em termos de valor, deve-se distinguir um teatro Romântico menor, preocupado com a nacionalização da nova literatura.

Martins Pena
Assinou os primeiros textos teatrais, numa linguagem coloquial que, no gênero, não foi superada por nenhum outro comediógrafo do século passado. O tom passa do cômico ao bufo, e a representação pode virar farsa a qualquer tempo.
Seu modo de sentir o social já era bem menos conservador que do primeiro grupo romântico. O eixo de sua comédia é o crescendo da urbanização, que desintegra o velho artesanato da Corte.
São diálogos que valem como excelente testemunho da língua coloquial brasileira tal como se apresentava em meados do século XIX.

Gonçalves Dias 
Sua melhor obra teatral, Leonor de Mendonça, tinha linha européia do drama histórico.  Compôs o drama com os olhos postos na restauração do teatro português.  A consciência do novo, do não mais clássico, também se revela pela justificação da prosa em lugar do verso, bem como pela apologia de um modelo shakesperiano de tragédia onde prosa e verso se revezariam segundo o tom e o ritmo dos afetos que movem os personagens.

Alencar 
Dose de “brasilidade”, compôs Verso e Reverso. O Demônio Familiar, comédia em que os vaivérs da intriga são obra de um escravo.

A Consciência histórica e crítica 
A crítica deste período tem como fator comum a ênfase dada à autonomia do país. Há em todo o país um nacionalismo crônico e quase agudo que se baseiam no indianismo, no regionalismo, sertanismo.
Porém, não foi sempre esta a linha seguida pelos jovens da época, Dividem-se então estes em grupos distintos entre si:
a)      Grupo fluminense - entre passadista e eclético, instala oficialmente o Romantismo no teatro, historiografia e poesia;
b)      Grupo paulista - fundam uma sociedade que defendem as teses americanistas;
c)      Grupo maranhense - paralelo aos anteriores, porém, mais liberais;
d)     Grupos pernambucano- representa a ponte de lança do progressismo liberal romântico.



Tradicionalismo 
As antinomias que marcaram o século XIX foram várias: campo/cidade, poder central/poder local; etc. A conciliação ideológica se fez a partir da primeira geração romântica. Surgem correntes abolicionistas e republicanas. O Brasil tem uma literatura original a partir da Independência.
Dá-se ênfase ao nexo entre as letras e os contextos histórico-geográficos.

Radicalismo 
Das províncias do Nordeste vieram formas de pensar mais críticas. Surgem obras de cunho “jacobinista” e que já fermentam idéias democráticas e socializantes.

V - O Realismo  um novo ideário 
Com o Brasil em crise, acelera-se a decadência da produção açucareira. Surge o fermento das idéias liberais e abolicionistas. Entre os anos de 1870 e 1890 são estas as teses esposadas pela inteligência nacional.
O tema da Abolição, bem como o da República, serão o fulcro das opções ideológicas do homem culto brasileiro a partir de 1870.
Deve-se à Escola do Recife a transposição desta realidade em termos de consciência cultural. 
A atitude de aceitação da existência tal qual ela se dá aos sentidos, desdobra-se na cultura da época, em planos diversos mas complementares:
a)      no nível ideológico, ou seja, na esfera de explicação do real;
b)      no nível estético em que o próprio ato de escrever é o reconhecimento implícito de uma faixa de liberdade.
O Realismo se tingirá de Naturalismo, no romance e no conto, sempre que fizer personagens e enredos se submeterem às lei naturais, ou se dirá Parnasiano, na poesia, do verso sempre perfeito.

A ficção 
O Realismo ficcional aprofunda a narração de costumes contemporâneos da primeira metade do século XIX e de todo o século XVIII. Aguçam-se os dons de observação. A configuração do típico foi uma conquista do Realismo.
Em termos de construção, houve descarnamento do processo expressivo.  O determinismo reflete-se na perspectiva em que se movem os narradores ao trabalhar as suas personagens. Assim, do Romantismo ao Realismo, houve uma passagem do vago ao típico, do idealizante ao factual.

Machado de Assis
Este é, sem dúvida, o ponto mais alto e equilibrado da nossa ficção.
O seu equilíbrio era o dos homens que, sensíveis à mesquinhez humana e à sorte precária do indivíduo, aceitam por fim uma e outra como herança inalienável, e fazem de sua reflexão cotidiana.
Foi com um espírito de permanente alerta para que nada de piegas, nada de enfático, nada de enfático nada de idealizante se pusesse entre criador e criatura que machado escreveu suas obras.
Menos do que pessimismo sistemático, melhor seria ver como suma da filosofia machadiana um sentido agudo ao relativo: nada valendo como absoluto, nada merece o empenho do ódio ou do amor.
A sua ficção constitui, pelo equilíbrio formal que atingiu um dos caminhos permanentes da prosa brasileira na direção da profundidade e da universalidade.

Raul Pompéia
Autor de um livro só: O Ateneu, possuía dom de memorialista finura de observação moral. Em sua obra, a captação dos ambientes e das pessoas não dispensa o expressionismo da imagem. As aproximações são, em geral, violentas e, no caso das pessoas, depressivas.
Não fora o seu talento excepcional de artista, Raul Pompéia teria naufragado no puro romance de tese.

Aluísio Azevedo e os principais naturalistas
Em Aluísio, a influência de Zola e de Eça é facilmente sentida.
Em face de certa vaguidade romântica no trato das personagens, foi salutar o deslocamento do eixo tara o homem comum, desfigurado, mais do que se acreditava, pelos revezes da herança biológica, da  familiar, da profissão.
O Mulato, que passa pelo primeiro romance naturalista brasileiro, dá uma boa visão do meio maranhense o tempo.
O mérito do autor estaria em saber aplicar a outros ambientes o dom de observação de que fizera prova. Somente em O Cortiço atinou de fato a forma que se ajustava a seu talento: Existe o quadro: dele derivam as figuras.
 O Cortiço foi um passo adiante na história da nossa prosa.
Inglês de Sousa não foi menos escrupuloso narrador de casos amazônicos com que antecipou o próprio Aluísio no manejo da prosa analítica.
Em Contos Amazônicos, o naturalismo faz o processo à Natureza, o que nos dá conta da carência de frescor nas descrições além da queda fatal dos homens, duplamente sujeitos à lei do sangue e às pressões do ambiente.
Do Naturalismo tomou Adolfo Caminha a crença na fatalidade do meio e o gosto dos temas escabrosos. A Normalista e O Bom Crioulo centram-se em casos de corrupção que a marcha da narrativa mostra como inevitável.

Naturalismo estilizado: “Art Nouveau”
Na década de 80 afirmara-se, com as obras como O Cortiço, O Missionário e O Bom Crioulo, o Naturalismo entre nós.
Desenvolve-se um estilo mundano, meio jornalístico, meio sofisticado.
Dos fins do século à guerra de 1914-18, a corrente mestra de nossa literatura admirou supremamente desse estilo floreal.
Dessa indefinição adveio uma prosa ficcional compósita, misto de documento e ornamento, aquém-to naturalismo na medida em que se perdia em veleidades fantasistas, mas igualmente incapaz de se fixar o Simbolismo pela carência de uma imaginação realmente criadora.

Coelho Neto
A fortuna crítica de Coelho Neto conheceu os extremos do desprezo a da louvação. Sobressai como a grande presença literária entre o crepúsculo do Naturalismo e a Semana de 22.
As qualidades mestras de Coelho Neto ajustavam-se - curiosidade, memória e sensualidade verbal.
De relevância, escreve, em 1897, Inverno em Flor, cuja obra possui viva coloração naturalista.
Em suma, sua linguagem é correta e precisa até ao pedantismo, à obscuridade, ao preciosismo. O que validamente se lhe contesta é aquela qualidade rara de atingir sem escórias um nível de profundidade.

Afrânio Peixoto
Não deixou uma obra de ficção tão volumosa, dadas as suas múltiplas curiosidades de divulgador e erudito. Escreveu romances de costumes rurais. Seu realismo sertanejo e, portanto, de extração romântica. No entanto, aquele seu mundanismo diplomático que lhe desvirilizara os primeiros romances o impediu aqui de ascender à epicidade bronca que o argumento propiciava.

O regionalismo como Programa
Em alguns constistas, matéria rural é tomada a sério, isto é, assumida nos seus precisos contornos físicos e sociais dentro de uma concepção mimética de prosa..
O projeto explícito dos regionalistas era a fidelidade ao meio de descrever: aprofundavam a linha realista estendendo-a para a compreensão de ambientes rurais ainda virgens para a nossa ficção.
Dentre os vários escritores que seguiram esta linha, podemos citar: Afonso Arinos, Valdomiro Silveira, Simões Lopes Neto, Alcides Maya, Hugo de Carvalho Ramos e, dentre todos estes, o mais importante: Monteiro Lobato.


A Poesia
Com os promotores da Escola de Recife e alguns poetas forrados de ingênuo materialismo e fortes convicções antimonárquicas, pretendiam demolir, à força de versos libertários, os pilares do conservantismo romântico que se ajustara tão bem ao sistema de valor do Segundo Império.
Quanto ao nexo literatura-sociedade: atuando entre 1880 e 90 os principais liberais e republicanos e fixando-se como forma de vida do escritor a díade burocracia-boemia, vai perdendo terreno a poesia de combate triunfando a escola oficial do verso parnasiano.

O Parnas1anismo
É na convergência de ideais anti-românticos, como a objetividade no trato dos temas e o culto da forma, que se situa a poética do Parnasianismo.
Seus traços de relevo são: o gosto da descrição nítida, concepções tradicionalistas sobre metro, ritmo e rima e, no fundo, o ideal da impessoalidade que partilhavam com os realistas do tempo.
Deste modo, cumpre lembrar alguns poetas parnasianos tais como, Alberto de Oliveira, Raimundo Correia, Olavo Bilac, Francisca Júlia, Artur Azevedo e Vicente de Carvalho.

Neoparnasianos
À geração dos poetas que estrearam entre 1880 e 90, sucedeu-se outra a que denominamos neoparnasiana, mas que no fundo, é ainda parnasiana, epigônica.
Vista em conjunto, a poesia neoparnasiana traduz em suma a persistência de uma concepção estética obsoleta, que o Simbolismo europeu já ultrapassara, abrindo caminho para as grandes correntes poéticas do novo século: futurismo, surrealismo, expressionismo...
Desta forma, o neoparnasiano que mais se destacou foi: Raul de Leôni.

A consciência histórica e crítica
Dentre os críticos que mais se destacaram na linha de pensamento dos Realistas é lícito mencionarmos os nomes de Capistrano de Abreu, Sílvio Romero, Araripe Júnior e José Veríssimo.

As letras como instrumento de ação
O período realista conheceu amplamente o uso da palavra como forma de ação política.
A linha mestra de toda essa fase foi a luta pela liberdade.
Nesses contextos há um nome que testemunhou quase miticamente o modo de pensar das elites brasileiras que constituíram a República: o de Rui Barbosa. Era um orador de notável cultura. Jurista e político, participou da elaboração do projeto do Código Civil.

VI-O simbolismo caracteres gerais
O símbolo reage às correntes analíticas dos meados do século. Exprimem o desgosto das soluções racionalistas e mecânicas e nestas reconhecem o correlato da burguesia industrial; ambos recusam-se a limitar a arte ao objeto, à técnica de produzi-lo, enfim, esperam ir além do empírico e tocar, com a sonda da poesia, um fundo comum que susteria os fenômenos, chame-se Natureza, Absoluto, Deus ou Nada.
O símbolo assume nessas correntes a função-chave de vincular a parte ao Todo universal que, por sua vez, confere a cada uma seu verdadeiro sentido.
O Simbolismo surge nesse contexto como sucedâneo, para uso de intelectuais, das religiões positivas.
O irracionalismo dos decadentes valeu como sintoma de algo mais importante que os seus mitemas: o incômodo hiato entre os sistemas pretensamente racionais e liberais da sociedade contemporânea e a efetiva liberdade do homem que as estruturas socioeconômicas vão lesando na própria essência, reduzindo-o a instrumento de mercado e congelando-o em papéis cada vez mais oprimentes. Os Simbolistas tiveram esta função relevante: dizer do mal-estar profundo que tem enervado a civilização industrial; e o fato de terem oferecido remédios inúteis, quando não perigosos, porque secretados pela própria doença, não se deve servir de pretexto para tardias excomunhões.

O Simbolismo no Brasil
Contemporâneos ou vindos pouco depois dos poetas parnasianos e dos narradores realistas, Cruz e Sousa, Alphonsus de Guimaraens e os simbolistas da segunda geração não tiveram atrás de si uma história social diversa da que viveram aqueles.
Apesar disso, em virtude de terem corrido paralelamente às correntes Neoparnasianas, o Simbolismo não exerceu, no Brasil, a função relevante que o distinguiu na literatura européia.

Poesia
Foi, sem a menor sombra de dúvidas, que podemos afirmar que, se houve Simbolismo no Brasil, este somente se deu a partir e em virtude de Cruz e Sousa, com a publicação de Broqueis.
A linguagem utilizada por ele foi revolucionaria de tal forma que os traços parnasianos mantidos acabam por integrar-se num código verbal novo e remeter a significados igualmente novos.
Um dos recursos morfológicos ou, a rigor, morfo semânticos, frequentes no autor, é o emprego insólito do substantivo abstrato no plural capaz de sugerir uma dimensão sensível no universo das idéias.
Cumpre lembrar ainda que, em virtude de sua diversidade de tom fluido e expressivo, faz-se necessária a menção do nome de Alphonsus de Guimaraens.

A difusão do Simbolismo
Como já anteriormente mencionado pela análise da obra em questão, tem-se como dos principais precursores do Simbolismo no Brasil a figura de Cruz e Sousa. Entretanto, várias correntes se seguiram e se dividiram, por diferenciarem quanto a ideais, regiões, e mestres inspiradores, como é o caso de Emiliano Peneta, simbolista paranaense, Eduardo Guimaraens, representante da corrente do Rio Grande do Sul, etc.

A Prosa de ficção
Pela origem e natureza da sua estética, o Simbolismo tendia a expressar-se melhor na poesia do que nos gêneros em prosa.
Da mole de contos, quadros, fantasias e devaneios em prosa escritos nessa época, é justo que se ressalvem algumas obras representativas da forma simbolista. E o caso de Signos, de Nestor Vitor que trabalha uma linguagem expressionista; Confessor de Mágoas, de Lima Campos; e Horto de Mágoas, de Gonzaga Duque.

O pensamento crítico
A crítica dos fins do século XIX, representada pela tríade Sílvio Romero-José Veríssimo- Araripe Jr., foi, em geral, hostil aos simbolistas. Foi do interior do movimento que nasceram os critérios conaturais aos valores encarecidos por seus poetas. Daí, terem sido militantes simbolistas seus melhores críticos: Gonzaga Duque e Nestor Vitor.
Foi somente com Nestor Vitor que a corrente encontra o seu claro espelho. De espírito aberto às várias tendências do pensamento e da arte pós-naturalista. Vitor era mais um semeador eclético de idéias que, a rigor, um crítico dos valores estritamente literários da obra.


VII- Pré-Modernismo e modernismo - Pressupostos históricos
O que a crítica chama de Modernismo está condicionado a um acontecimento, como um divisor de águas: A Semana da Arte Moderna, realizada em Fevereiro de 1922, na cidade de São Paulo.
Dentro de um panorama de Brasil onde imperava a hegemonia política dos Estados de São Paulo e de Minas Gerais (política “café com leite”), dentre outros fatores originados pelo pós-guerra, o intuito da Semana em epígrafe era, nada mais nada menos do que chocar.
Falando de um modo genérico, é a sedução do irracionalismo, como atitude existencial e estética, que dá o tom aos novos grupos, ditos modernistas, e lhes infunde aquele tom agressivo com que se opõem em campo para demolir as colunas parnasianas e o academismo em geral.

Pré-Modernismo
Creio que se pode chamar de Pré-Modernista tudo o que, nas primeiras décadas do século, problematiza a nossa realidade social e cultural.
O grosso da literatura foi como é sabido, pouco inovador. Com isso, torna-se difícil determinar o que foi realmente o pré-modernismo, cabendo assim aos romances de Lima Barreto e de Graça Aranha, bem como ao ensaísmo social de Euclides, principalmente, o papel histórico de mover as águas estagnadas dos fins do século passado e início do presente.
Dentre todos estes autores cabe-nos aqui, de acordo com o que já foi analisado anteriormente em cada uma de suas obras, mencionar algo acerca de:
a)      João Ribeiro com sua crítica independente;
b)      Lima Barreto com seu romance social - Triste Fim de Policarpo Quaresma;
c)      Graça Aranha, um espírito aberto com Canaã, e Viagem Maravilhosa.

O Modernismo: Um clima estético e psicológico
Dado ao clima da época, como já foi dito anteriormente no início do capítulo em análise, só um grupo fixado na ponta de lança da burguesia culta poderia renovar efetivamente o quadro literário do país.
A Semana da Arte Moderna foi o ponto de encontro desse grupo, e muitos dos seus traços menores. O fato mais importante antes da Semana foi à exposição de Anita Malfatti em dezembro de 1 917.
Apesar de vários elementos passadistas, o grupo foi se tornando cada vez mais coeso, no biênio 1920-21, quando se afirma publicamente pela arte nova.
Para que acontecesse a Semana, tudo já estava preparado. A coesão do grupo paulista, os contatos deste com alguns intelectuais do Rio e a adesão do prestigioso Graça Aranha significavam que o Modernismo poderia lançar-se como um movimento.

Grupos Modernistas nos estados
Após a Semana e, ao contrário do que muitos pensam, o Modernismo não se operou somente no: Rio de Janeiro-São Paulo. Prova cabal disto é o surgimento de grupos no Nordeste, Minas Gerais e outros Estados da Federação, cujos intelectuais encontravam-se atentos às mudanças ocorridas na Semana e impetraram também, nestes e em outros Estados às mudanças advindas com a Semana.
                        
Os Autores e as obras
As inovações atingem os vários estratos da linguagem literária, desde os caracteres materiais da pontuação e do traçado gráfico do texto até as estruturas fonéticas, léxicas e sintáticas do discurso.
Vista sob esse ângulo, a “fase heróica” do Modernismo foi especialmente rica de aventuras experimentais tanto no terreno poético como no da ficção.
Quanto aos autores, cumpre ainda lembrar os nomes de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, ManueI Bandeira, Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia, Raul Bopp, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida, Alcântara Machado, Sérgio Milliet e Paulo Prado que se destacaram dentre os demais Modernistas da nossa época.

VIII- tendências contemporâneas o modernismo e o Brasil depois de 30
A Semana foi um acontecimento e uma declaração de fé na arte moderna. Já o ano de 1930 evoca menos significados literários prementes por causa do relevo social assumido pela Revolução de Outubro.
Somos hoje contemporâneos de uma realidade econômica, social, política e cultural que se estruturou depois de 1930. As décadas de 30 e 40 vieram ensinar muitas coisas úteis aos nossos intelectuais.
Enfim, o Estado Novo e a II Guerra Mundial exasperam as tensões ideológicas; e, entre os frutos maduros da sua introjeção na consciência artística brasileiras contam-se obras-primas com A Rosa do Povo, Poesia Liberdade, Memórias do Cárcere, etc.

A ficção
Os decênios de 30 e 40 são lembrados como “a era do romance brasileiro”. E não só de ficção regionalista, mas também da prosa cosmopolita e das páginas de sondagem psicológica e moral.
Socialismo, freudismo, catolicismo existencial: eis as chaves que serviram para a definição do homem em sociedade e sustentariam ideologicamente o romance empenhado desses anos fecundos para a prosa narrativa.
Tornou-se comum em toda parte uma ficção aberta, cujo comportamento começou a parecer bem mais fascinante. Difunde-se o gosto da análise psíquica, da notação moral, de um realismo psicológico bruto como técnica ajustada há um tempo em que o homem se dissolve na massa: são os romances; Contemporâneos do facismo, racismo, do stalinismo.

As trilhas do romance: Uma hipótese de Trabalho
Há uma oposição ego/sociedade que funda a forma romanesca e a mantém enquanto tal.
Se da parte do herói são várias as maneiras de atuar a dialética de vínculo e oposição ao meio, no romancista a consciência que projeta as personagens toma a forma de ironia, modo ambíguo de propor e, mesmo tempo, transcender o ponto de vista do herói.
Nessa perspectiva poderíamos distribuir o romance brasileiro, de 30 para cá, em pelo menos quatro pedências, segundo o grau crescente de tensão entre o “herói” e o seu mundo:
a)      Romances de tensão mínima - há conflito, mas este se configura em termos de oposição verbal, sentimental quando muito;
b)      Romances de tensão crítica - o herói opõe-se e resiste agonicamente às pressões da natureza e do meio social;
c)      Romances de tensão interiorizada - o herói não se dispõe a enfrentar a antinomia pela ação: evade- se subjetivando o conflito;
d)     Romances de tensão transfigurada - o herói procura ultrapassar o conflito que o constitui existencialmente pela transmutação mítica ou metafísica da realidade.

Deste modo, cumpre lembrar os nomes de alguns autores contemporâneos: José Américo de Almeida, Raquel de Queirós, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Érico Veríssimo, Marques Rabelo, José Geraldo Vieira, Lúcio Cardoso, Cornélio Pena, etc.

Permanência e transformação do Regionalismo
O Nordeste, de onde vieram os clássicos do neorrealismo, tem concorrido com uma copiosa literatura ficcional, que vai do simples registro de costumes locais à aberta opção de crítica e engajamento que as condições da área exigem.
Ao lado desse filão romanesco neoverista, alguns prosadores têm ensaiado sínteses formais novas que procuram dar ênfase nos aspectos humanos universais que a matéria provinciana ou rústica lhe propicia.
A esse tipo de prosa ajustou-se bem o uso intensivo do monólogo.
Combinando lenda e humor, tradição popular e paródia, o dramaturgo paraibano Ariano Suassuna surpreendeu seu público com duas narrativas de fôlego, A Pedra do Reino e O Rei Degolado.
A Poesia
Foi a expressão poética a que mais pronta e mais radicalmente se alterou com a viragem modernista.
Renovar a linguagem está no cerne das preocupações e dos projetos de todos.
Faz-se necessário lembrar os nomes de alguns poetas contemporâneos como é o caso de Vinícius de Morais, Cecília Meireles, Jorge de Lima, Murilo Mendes, entre outros.

A Crítica
O Modernismo arejou tudo, beneficiando também a crítica literária que, continuava a ser, em plena década de 20, uma fortaleza do academismo neoparnasiano.
Dentre os novos críticos encontram-se nomes como Tristão de Ataíde, Álvaro Lins, Afrânio Coutinho. Antônio Cândido de Mello e Souza, além de Otto Maria Carpeaux que aparece hoje como divisor de águas entre modos de ler menores e, não raro, provincianos, e uma consciência crítica poderosa da literatura como sistema enraizado na vida e na história da sociedade.

Colaborou intensamente em alguns jornais do Rio e de São Paulo, escrevendo artigos e ensaios sobre grandes escritores estrangeiros que aqui se conheciam pouco ou nada.

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